05 março 2009

Lola

O documento novos rumos para a saúde é um bom ponto de partida para a análise do sector da saúde em Portugal. É interessante porque fornece um conjunto de dados e elementos fundamentais, mas é ainda mais interessante porque permite fazer um retrato das soluções que o PSD e PS têm vindo a implementar, ao longo dos últimos 30 anos.
RAF caracteriza de forma excelente os problemas e as limitações de uma organização colectivista, como o SNS. Em particular, explicita as vantagens de um sistema de mercado, baseado no preço:

Nunca é despropositado referir que um sistema baseado no preço formado livremente no mercado apresenta um conjunto de virtualidades que, como ponto de partida, importa recapitular: o preço 1) representa uma medida de valor (o “ponto de encontro” entre a quantidade oferecida e procurada), 2) actua como mecanismo de distribuição dos recursos, 3) funcionando assim como medida de eficiência. Mas não só: 4) um sistema de preços traduz-se, ainda, num fortíssimo esquema de informação relativa e de incentivos (Berky, 1983).

O problema está nas soluções. Como não existe mercado, RAF propõe a utilização de um modelo que reproduza, tanto quanto possível, um mercado:

Para que se possa avançar para um sistema dotado de maior eficiência, que salvaguarde a qualidade dos cuidados prestados, é importante que os seus processos sejam capazes, desde logo, de ultrapassar – ou de, pelo menos, minimizar – as lacunas que derivam do facto de não se utilizar um sistema de preços livremente formados no mercado. Para isso, há dois aspectos que não podem ser negligenciados: 1) a produção de informação e 2) um correcto alinhamento de incentivos. E, nestes dois planos, há ainda um longo caminho a percorrer.
Na verdade, para que o recurso a métodos prospectivos – em que a produção e os preços são negociados previamente entre o poder político (financiador) e os agentes (unidades de saúde) – cumpra o seu objectivo, é necessário que 1) exista um sistema de preços que disponha de informação completa e correcta, que 2) não remunere a ineficiência, e que 3) incorpore um conjunto amplo de variáveis (gravidade, morbilidade, estrutura etária), para que não induza à selecção adversa. Ora, só a adequada implementação de um sistema de preços com estas características possibilitará um apropriado alinhamento entre aquilo que é o interesse das unidades de saúde e o dos utentes, em matéria de qualidade e eficiência. Permitirá, além do mais, aferir quem são as unidades de saúde, por serviço prestado, que ministram melhores cuidados (os quais poderão ser medidos em função da eficiência e qualidade), assim como a monitorização contínua dos diversos processos, por comparação, a partir da análise das unidades que apresentem os melhores resultados (“benchmarking”).

Ora, é evidente neste texto a confusão entre preços de mercado e tabelas de valores estabelecidos administrativamente. O administrativismo não pode nunca substituir o empresarialismo. Este tem sido, na minha opinião, o principal erro dos “partidos de governo”, na saúde.
O resultado é que o SNS tem agora todos os defeitos de um sistema público, acrescidos dos defeitos do sector privado (problema de identidade!). Obviamente, é muito difícil gerir quaisquer recursos, materiais ou humanos, no meio desta baralhada, e é por isso que os profissionais de saúde acabam sempre como bodes expiatórios, quando as coisas não correm bem.
É este paradigma que é preciso mudar.
Haja saúde!

Na foto, Lola, do filme "Todo sobre mi madre".
Como Manuela dice en cierta escena de la película: “Lola tiene lo peor de un hombre y lo peor de una mujer”. Lo cual muestra el problema de identidad de su personaje.

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