10 novembro 2008

em mercado livre


A cultura portuguesa, e mais geralmente a cultura católica, não pode passar sem a instituição da censura - uma instituição que impeça a expressão livre do pensamento. Durante o Estado Novo a censura era oficial. Nós sabíamos quem eram os censores, onde eles estavam e ao que eles andavam.

Então e agora, que não existe censura oficial? Agora a censura exerce-se de forma espontânea numa uma espécie de mercado livre que visa coarctar o pensamento e as ideias. Neste mercado, a censura pode emanar espontaneamente de qualquer português porque é uma instituição imanente à sua cultura, algo que lhe está na massa do sangue.

O Ricardo ilustrou no post anterior uma forma de censura espontânea: uma ideia ou argumento é bombardeada com tantas objecções irrelevantes, mas todas elas tendencialmente destrutivas, que ao cabo de algum tempo a ideia está destruída, sem que fique alguma como alternativa, e o autor, exausto, cala-se e nunca mais volta ao assunto. A ideia está censurada para sempre. Esta forma de censura espontânea é como matar um elefante com alfinetes: espeta-se um alfinete no elefante, dois ou três. Nenhum deles o mata. Mas ao cabo de vinte milhões de alfinetadas o elefante está morto. Repare-se o estado em que o Ricardo acabou (aqui) depois de um dia antes ter apresentado com vigor uma proposta racional para a avaliação dos professores.

Uma segunda forma de censura espontânea, talvez ainda mais popular que a anterior, é o insulto. Uma pessoa apresenta uma ideia para discussão. Os outros, sem quaisquer argumentos racionais, desatam a insultá-lo. Mais cedo ou mais tarde, o autor vai-se calar e a ideia fica censurada para sempre. Existe em cada português um tiranete, um censor potencial. A blogosfera, com o seu anonimato e o recurso aos nicks, veio aumentar a produção censória em mercado livre.

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