22 novembro 2008

contra os juizes, contra a justiça...


Dias Loureiro, ex-administrador da Sociedade Lusa de Negócios (SLN), detentora do Banco Português de Negócios (BPN), veio ontem a público numa entrevista à RTP explicar a sua inocência num caso que está a correr na justiça - o de alegadas irregularidades na gestão do BPN.

Num país de tradição protestante, como os EUA, O Canadá ou Grã-Bretanha esta entrevista nunca teria ocorrido. O meu ponto neste post é o de explicar a culturalidade desta entrevista e prever o desfecho do caso BPN no que diz respeito a Dias Loureiro.

Primeiro, o veredicto da justiça, que seria o veredicto de um tribunal em país protestante: condenado. A existirem irregularidades no BPN, Dias Loureiro, assinando as contas da SLN na qualidade de administrador, deu cobertura a essas irregularidades. Se não sabia delas, devia saber.

Pelo contrário, o veredicto em Portugal vai ser: inocente. E o primeiro passo para este veredicto foi dado ontem com a entrevista à RTP. Ao fazê-lo, Dias Loureiro criou um tribunal que a partir de agora vai passar a julgar o caso em paralelo ao tribunal da justiça, de um modo muito semelhante ao que aconteceu no caso Casa Pia. Dias Loureiro, de resto, fez ontem lembrar Carlos Cruz quando espontaneamente se apresentou na televisão para reclamar a sua inocência.

Na competição entre os dois tribunais - o popular e o da justiça - vai prevalecer o veredicto do tribunal popular, porque nenhum juiz ousará proferir uma sentença que vá contra o sentimento dominante da opinião pública. E qual vai ser a evolução do caso, que só agora começou, na opinião pública?

O padrão da sua evolução está descrito aqui:

"O povo está tão deseducado ou tão defeituosamente educado que não comporta a justiça.
...
Basta ver as reacções do nosso povo diante dos grandes crimes, a que os jornais dão proporções escusadas. O primeiro movimento é de violência, de rancor, quase de ódio, contra o criminoso, contra os seus maus instintos, contra a fera, etc., etc... Mas o assassino é julgado e há sempre uma figura humana que aparece na teia, ao seu lado: a companheira dedicada, a mãe velhinha, o filho abandonado... E logo se sente uma reviravolta, um movimento de compaixão na opinião pública: "Coitado! Pobre homem! Bem basta o que sofreu..." E quando é lida a sentença, quando a pena é justa mas grande, sente-se de novo, nas entrelinhas dos jornais, nos rumores do público, um novo movimento de violência, de rancor, quase de ódio, mas contra os juizes, contra a justiça..."
(Salazar em António Ferro, Entrevistas a Salazar, op. cit., pp 51-52)

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