25 novembro 2008

As notícias sobre a minha morte são muito exageradas


Nas últimas semanas, surgiram notícias relativas a alguns investimentos do famoso Warren Buffett, em instrumentos derivados que especulam na direcção do mercado accionista (não confundir com derivados de crédito). De acordo com a Bloomberg, o risco de Buffett, caso os mercados de acções permaneçam em queda, é poder vir a ter de pagar 35 mil milhões de dólares a outros investidores, que servem de contraparte na transacção dos instrumentos derivados. Como este valor excede a liquidez que Buffett possui actualmente em carteira, tem-se especulado acerca da possibilidade, aliás, da probabilidade de Bufffet declarar falência. Enfim, confesso que me parece um cenário manifestamente exagerado.

Warren Buffett realizou um investimento equivalente à venda de uma opção de venda, ou seja, vendeu uma "Put Option". Uma opção de venda representa o direito de vender um determinado activo a um certo preço no futuro, mas que fica definido no presente. Quem compra a opção de venda, através do pagamento de um prémio, fica com esse direito. E quem a vende, recebendo o prémio, fica com a obrigação de comprar o activo ao preço estipulado no contrato. O objectivo das opções de venda é garantir a protecção do comprador em caso de evolução desfavorável do activo subjacente. Quanto ao vendedor, recebe um prémio por um activo que julga sobrevalorizado, em antecipação de uma eventual correcção da respectiva cotação, até ao preço de exercício.

Por exemplo, nas acções do Citigroup, que registaram uma grande desvalorização nos últimos meses e que estão agora a 6 dólares por acção, existirão investidores que tendo comprado acima deste preço não estarão a perder dinheiro. Porque, entretanto, compraram também opções de venda com preço de exercício superior ao seu preço de compra e à cotação actual. Ao invés, quem vendeu essas opções de venda, tendo sido obrigado a comprar ao preço de exercício, é que está a perder a diferença, contudo, acredita agora na recuperação da cotação das acções do Citigroup.

No caso de Buffett, este terá vendido opções de venda sobre os principais índices accionistas mundiais, em particular o S&P500 (norte-americano), suponho que com um preço de exercício na casa dos 1100 pontos (está agora a 850), e também o Dax (alemão). Na altura em que a transacção se realizou estes índices estavam acima do preço de exercício. Ou seja, o investimento realizado então por Buffett indicava que este investidor estava à espera de uma correcção nos mercados, mas que ao preço de exercício ficaria muito contente em ser obrigado a comprar as acções componentes desses índices. Assim, enquanto esperava pela correcção, recebeu um prémio superior a 6 mil milhões de dólares, que poderá ter utilizado para realizar outros investimentos.

Entretanto, o preço de exercício foi ultrapassado na baixa, apesar das opções só serem executadas em 2019. Até lá, Buffett está sentado em cima de perdas potenciais, que só serão encaixadas, a partir de 2019, se nessa data o mercado permanecer abaixo do seu "strike price" (preço de exercício). Mas, mesmo então, continuarão apenas a ser perdas potenciais enquanto Buffett não vender as acções que entretanto terá sido obrigado a comprar. Quanto ao valor máximo de perda, os tais 35 mil milhões de dólares, seria necessário que quer o S&P500 quer o DAX baixassem para zero. Ou seja, era preciso que o mundo acabasse!

Ao preço actual do S&P500, assumindo um Strike de 1100 e uma posição semelhante no DAX, na pior das hipóteses, Buffett estará a braços com uma perda potencial de 8 mil milhões de dólares. Contudo, convém não esquecer que recebeu à cabeça um prémio de 6 mil milhões. Em suma, a situação de Buffett não é famosa. Talvez ajude até a explicar o artigo que escreveu há semanas atrás no NYT, no qual dava a conhecer ao mundo que estava optimista em relação ao mercado de acções, uma iniciativa invulgar em Buffett. Mas daí até à sua falência vai uma grande distância.

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