No passado domingo, despertei com uma notícia extraordinária: a Entidade Reguladora do Sector Eléctrico (ERSE) propõe que a EDP transfira os custos associados às suas facturas incobráveis para a esfera dos restantes consumidores de electricidade. Incrível. Ou melhor, que grande lata! Na opinião do Dr. Mário Frota, da Associação Portuguesa do Direito ao Consumo (APDC), trata-se de “uma forma despudorada de transferir directamente para os consumidores encargos que têm que ser assumidos pelas empresas e abatidos aos seus lucros” (Agência Lusa, 16/06). Confesso que após a introdução da notícia, não quis mais saber qual é o calote que a EDP enfrenta nem quanto este poderia onerar a factura de cada um de nós se nos fosse imputado administrativamente.
Caros leitores, gostava de me penitenciar: recentemente encontrei na EDP um ódio de estimação. Apesar de todos os méritos que reconheço à sua actual equipa de gestão, em especial, a sua estratégia de liderança no campo das energias renováveis e o facto de ter colocado uma empresa portuguesa no mapa mundial. Contudo, há situações verdadeiramente inaceitáveis e esta é uma delas. Sobretudo quando, de forma chocante, esta é patrocinada pela ERSE – entidade que devia zelar pelos interesses dos cidadãos. Felizmente, a proposta está ainda em discussão pública. Que alívio!
A posição da APDC deve ser suficiente para rechaçar a ERSE. Isto, apesar da outra associação de defesa do consumidor, a DECO, estar disposta a discutir a posição da entidade reguladora. Diz a DECO, através do seu secretário geral, o Dr. Jorge Morgado, que “à luz do princípio de que são os consumidores que pagam tudo, é provável que os custos dos incobráveis já estejam a ser pagos pelos clientes de forma encapotada" (Agência Lusa, 16/06). Ou seja, o que a DECO parece querer dizer é que se deve formalizar algo que já está a ser feito. Mas que posição notável! O que a DECO deveria fazer, em vez de tolerar uma situação intolerável, era confirmar se já está a ocorrer alguma imputação tarifária irregular e denunciá-la junto da ERSE.
Por detrás da proposta da ERSE, presume-se, está a própria EDP. E compreende-se bem porquê. Todo o executivo gosta de gerir um monopólio. E, nessa gestão monopolista, inclui-se a manipulação dos preços e a coerção junto dos órgãos reguladores do sector. Utilizando uma analogia com a política do Estado Novo, a ERSE é para a EDP, o que Américo Thomaz era para Salazar. Voltando à questão tarifária, não se compreende por que razão a EDP não há de fazer como qualquer outra empresa quando se depara com um activo incobrável, ou seja, amortizá-lo. Imaginem só o que sucederia, no caso dos bancos, recentemente tão afectados com créditos “subprime” incobráveis, se estes decidissem repercutir essas perdas sobre os restantes clientes através de taxas de juro mais elevadas sem qualquer justificação contratual. Caíam o Carmo e a Trindade!
Além disso, numa altura em que a EDP acaba de encaixar mais de 1,5 mil milhões de euros com a OPV da Renováveis, a ideia da ERSE é, a todos os títulos, obscena. E, não esqueçamos, a EDP é uma empresa rentável – apesar do famoso défice tarifário. O que me leva à próxima observação. Dado que existe o défice tarifário, então, que se crie ou agrave um imposto indirecto, especificamente indexado ao custo da electricidade, por contrapartida de uma redução nos impostos directos, que permita compensar a EDP pela perda operacional incorrida. Claro está, que esta minha sugestão é apenas uma segunda melhor alternativa. A primeira seria, sem dúvida alguma, abrir o sector aos privados e privatizar, integralmente, a EDP. Contudo, dado que, sempre que no nosso país se entrega um sector aos privados, os preços, invariavelmente, aumentam, faz com que seja prudente seguir a via mais pragmática em alternativa à mais idealista. Em particular, nos tempos que correm – de grande agitação social.
(*) artigo publicado no semanário “Vida Económica” em 20/06/2008.
Caros leitores, gostava de me penitenciar: recentemente encontrei na EDP um ódio de estimação. Apesar de todos os méritos que reconheço à sua actual equipa de gestão, em especial, a sua estratégia de liderança no campo das energias renováveis e o facto de ter colocado uma empresa portuguesa no mapa mundial. Contudo, há situações verdadeiramente inaceitáveis e esta é uma delas. Sobretudo quando, de forma chocante, esta é patrocinada pela ERSE – entidade que devia zelar pelos interesses dos cidadãos. Felizmente, a proposta está ainda em discussão pública. Que alívio!
A posição da APDC deve ser suficiente para rechaçar a ERSE. Isto, apesar da outra associação de defesa do consumidor, a DECO, estar disposta a discutir a posição da entidade reguladora. Diz a DECO, através do seu secretário geral, o Dr. Jorge Morgado, que “à luz do princípio de que são os consumidores que pagam tudo, é provável que os custos dos incobráveis já estejam a ser pagos pelos clientes de forma encapotada" (Agência Lusa, 16/06). Ou seja, o que a DECO parece querer dizer é que se deve formalizar algo que já está a ser feito. Mas que posição notável! O que a DECO deveria fazer, em vez de tolerar uma situação intolerável, era confirmar se já está a ocorrer alguma imputação tarifária irregular e denunciá-la junto da ERSE.
Por detrás da proposta da ERSE, presume-se, está a própria EDP. E compreende-se bem porquê. Todo o executivo gosta de gerir um monopólio. E, nessa gestão monopolista, inclui-se a manipulação dos preços e a coerção junto dos órgãos reguladores do sector. Utilizando uma analogia com a política do Estado Novo, a ERSE é para a EDP, o que Américo Thomaz era para Salazar. Voltando à questão tarifária, não se compreende por que razão a EDP não há de fazer como qualquer outra empresa quando se depara com um activo incobrável, ou seja, amortizá-lo. Imaginem só o que sucederia, no caso dos bancos, recentemente tão afectados com créditos “subprime” incobráveis, se estes decidissem repercutir essas perdas sobre os restantes clientes através de taxas de juro mais elevadas sem qualquer justificação contratual. Caíam o Carmo e a Trindade!
Além disso, numa altura em que a EDP acaba de encaixar mais de 1,5 mil milhões de euros com a OPV da Renováveis, a ideia da ERSE é, a todos os títulos, obscena. E, não esqueçamos, a EDP é uma empresa rentável – apesar do famoso défice tarifário. O que me leva à próxima observação. Dado que existe o défice tarifário, então, que se crie ou agrave um imposto indirecto, especificamente indexado ao custo da electricidade, por contrapartida de uma redução nos impostos directos, que permita compensar a EDP pela perda operacional incorrida. Claro está, que esta minha sugestão é apenas uma segunda melhor alternativa. A primeira seria, sem dúvida alguma, abrir o sector aos privados e privatizar, integralmente, a EDP. Contudo, dado que, sempre que no nosso país se entrega um sector aos privados, os preços, invariavelmente, aumentam, faz com que seja prudente seguir a via mais pragmática em alternativa à mais idealista. Em particular, nos tempos que correm – de grande agitação social.
(*) artigo publicado no semanário “Vida Económica” em 20/06/2008.
Sem comentários:
Enviar um comentário