06 dezembro 2007

os liberais portugueses devem defender a igreja católica

Outra questão que os liberais portugueses têm de resolver, é a sua relação com a Igreja Católica. Com a Igreja Católica, note-se, não exactamente com Deus, a sua existência ou inexistência, assunto que diz exclusivo respeito à intimidade e à consciência de cada um, sobre o qual ninguém tem o direito mínimo de intervir.

Num país eminentemente católico como é o nosso, não é sensato, menos ainda liberal, estigmatizar a Igreja e as suas realizações. Os liberais são evolucionistas e tradicionalistas, no sentido em que acreditam que as instituições sociais existentes resultam do apuramento lento e sedimentado das melhores práticas do mercado. Por conseguinte, pretender combater a Igreja Católica – em nome de uma liberdade que já há muito está plenamente conquistada, a laicização –, é de um absurdo atroz.

Mais ainda: nestas matérias, como em muitas outras, não há que defender o igualitarismo, nomeadamente no tratamento putativamente igual dos poderes públicos das várias instituições religiosas. Se as pessoas são, em Portugal, maioritariamente católicas, é natural que o Estado, como entidade pública que as deve representar, privilegie as escolhas dominantes do mercado. Coisa diferente seria o Estado português discriminar, ou vedar mesmo, como fez no passado, o acesso das outras Igrejas ao mercado dos crentes, impedindo-as de, em plano de igualdade com a Igreja Católica, transmitirem a sua mensagem e converterem os incréus. Isso é que seria transformar o Estado português num Estado clerical católico, o que, diga-se, há muito tempo não acontece.

Por último, gostaria de transmitir a minha convicção pessoal de que a Igreja Católica tem, em Portugal, uma admirável obra social, que não tem qualquer paralelo na sociedade civil, menos ainda no próprio Estado. É mais do que natural que os seus responsáveis pretendam defender e ampliar essa obra, e terem a influência pública que lhe deve ser reconhecida, em função do que têm feito e das pessoas que representam. Num Estado liberal e laico, como o nosso é e como todos devem ser, quem souber, quiser e estiver disposto a fazer igual ou melhor, que avance.

A falta de consciência destes aspectos, bem como a inexistência de uma saudável relação dos liberais com a Igreja Católica, remetê-los-á para posições extremadas, de radicalismo político e social, que desmerecem o culto da liberdade, o único a que, de facto, devem publicamente prestar devoção. Nem Mário Soares, nem o Partido Socialista cometeram esse erro no pós-25 de Abril, eles que vinham duma tradição republicana que não era exactamente amiga da Igreja.

Declaração de interesses: sou ateu.

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