25 janeiro 2006

liberalismo em 2006?

Num comentário feito a um «post» que aqui editei, o André escreveu uma frase que considero quase enigmática: «O panorama que se apresenta não é fácil mas, apesar de tudo, julgo que nunca como em 2006 (com Sócrates a PM, Cavaco na presidência e o contexto internacional actual) estiveram reunidas tão boas condições para a afirmação de uma direita liberal em Portugal».
Sem ter a veleidade de fazer a exegese do texto do André e de ter conseguido interpretar exactamente o que ele quis dizer, julgo não errar excessivamente se afirmar que ele acredita que as pessoas estão, em Portugal, fartas da crise em que permanentemente vivem e que responsabilizarão o Estado por esse facto, por terem percebido que ele é efectivamente o seu principal responsável. Daí nasceria um campo fértil para cultivar as soluções que o liberalismo propõe, reforçado pelo facto de Cavaco, a última esperança de alguma direita, estar em Belém naturalmente limitado pelas funções do cargo, e de Sócrates liderar um governo socialista.
É, porém, um erro, meu caro. Infelizmente.
Em Portugal, ensina-nos a História e a História recente, que sempre que há crise (e há crise quase sempre), os portugueses responsabilizam o Estado, é certo, mas não tanto por ser causador da crise (em Portugal, não te esqueças, a culpa morre sempre solteira...), mas por não a resolver. Por isso, a resposta tradicional da direita (e da esquerda) à crise do Estado é, em Portugal, mais Estado. Veja o André o hiato «epistemológico» existente entre o prometido «choque fiscal» do PSD de Barroso e a política efectivamente seguida pelo governo do mesmo... «uma vez conhecida a grave situação do país».
Ou seja: num país pobre, com recursos escassos, com um produto nacional cada vez mais reduzido, sem economia, sem confiança, sem classe média, sem empresas prósperas e seguras no mercado comunitário, com taxas loucas de desemprego, as pessoas agarram-se ao Estado, que julgam ser ainda a entidade mítica que durante séculos se habituaram a venerar, para que lhes resolva os problemas que precisamente lhes criou.
Não deixa de ser engraçado ver-nos sistematicamente a pedir ao autor da desgraça que nos livre dela. Mas, meu caro André, em Portugal é assim mesmo. É mais ou menos como a «Gabriela» do Jorge Amado: já nasceu assim e vai ser sempre assim. À esquerda e, por maioria de razão, à direita.

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