07 maio 2024

A Decisão do TEDH (158)

 (Continuação daqui)




158. Go to the cock!


O Tribunal de Leiria absolveu ontem um cidadão de 20 crimes de difamação agravada a quatro magistrados, dois juízes e dois procuradores do MP. A juíza-presidente explicou a sentença dizendo que a decisão tinha seguido a jurisprudência [do TEDH], fazendo prevalecer o direito à liberdade de expressão sobre o direito à honra (cf. aqui). A menos que  a decisão seja revertida pela Relação - o que é pouco provável - evita-se, assim, mais uma condenação de Portugal no TEDH.

Em termos relativos, face à sua população, Portugal é o pais mais vezes condenado no TEDH por violação do direito à liberdade de expressão dos seus cidadãos e, em termos absolutos, creio (sujeito a confirmação) que também é. Só no último mês e meio já sofreu duas condenações.

Como explicar este fenómeno, que a tendência tem sido até agora, em Portugal, para fazer prevalecer o direito à honra sobre o direito à liberdade de expressão, uma ponderação que depois é invertida pelo TEDH?

Existem vários factores, todos concorrendo para esse fim. O primeiro é geográfico. Quem olhar para o mapa da Europa vê que Portugal é marginal, uma espécie de província, que esteve sempre longe das grandes batalhas que se travaram no centro da Europa pela liberdade e pela democracia.  E, quando se envolveu, a reboque de Espanha, foi para lutar contra a liberdade e a democracia.

O segundo factor está no facto de a cultura portuguesa ser uma cultura católica, que é uma cultura feminina, centrada na figura de Maria. As mulheres são mais sensíveis à ofensa do que os homens. A figura da donzela desonrada é ainda hoje uma figura trágica aos olhos de muitos portugueses. Os portugueses ofendem-se com imensa facilidade.

O terceiro factor é muito interessante e decorre ainda da cultura feminina (católica) dos portugueses. Existe muito maior variância na mulher do que no homem, a mulher é capaz de exagerar e de ir do oito ao oitenta com muito mais facilidade do que o homem, e a mulher aprecia a variedade muito mais do que o homem. 

Daqui decorre que a língua portuguesa tem uma variedade de expressões ofensivas, e que ofendem com uma tal intensidade, que não encontra correspondência nas línguas de culturas masculinas como é, por exemplo, a inglesa. No meu comentário televisivo eu usei expressões ofensivas como "politiqueiro", "juristas de vão de escada" e "palhaçada jurídica" que não têm fácil tradução em inglês.

Uma das expressões ofensivas mais frequentemente utilizadas pelos portugueses - a segunda, de acordo com o Ministério Público - é a expressão "filho da puta". Esta expressão existe em inglês e com um carácter igualmente ofensivo: "son of a bitch". Porém, quando chegamos à expressão ofensiva mais utilizada pelos portugueses - "Vai para o caralho!" - pura e simplesmente não existe tradução para inglês.

Não é que me falte vontade, mas se, a partir daqui, eu disser à Cuatrecasas "Go to the cock!" é duvidoso que mesmo os advogados ingleses da sociedade se sintam ofendidos. 

(Continua acolá)

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