(Continuação daqui)
54. Perdi a paciência
A Associação Joãozinho foi fundada em Janeiro de 2014 para dar continuidade a um projecto iniciado anos antes no Hospital de S. João (HSJ) do Porto - o de construir por via mecenática a ala pediátrica (desde 2009 que a ala pediátrica funcionava em contentores metálicos). Da direcção da Associação faziam parte o presidente e o vice-presidente do HSJ, embora em funções não executivas.
Cerca de um ano depois, a obra estava no terreno. A 3 de Março de 2015 houve uma cerimónia de lançamento da primeira pedra com a presença do primeiro-ministro Passos Coelho e outras personalidades (cf. aqui) e nesse mesmo dia foram iniciados os trabalhos. A primeira fase da obra consistia na demolição de velhas construções existentes no local, e na remodelação de outras.
Nesse primeiro ano, o trabalho da Associação foi intenso. Foi obtida autorização do Ministério da Saúde, na altura liderado pelo ministro Paulo Macedo; foi obtido o estatuto de utilidade pública para a Associação junto do Ministério do Trabalho e Segurança Social; foi contratualizada a obra com um consórcio de construtoras; foram visitados muitos mecenas potenciais e assinados vários contratos de mecenato; o projecto financeiro foi submetido ao Tribunal de Contas para certificar que não estavam envolvidos dinheiros públicos nem eram criados encargos para o Estado, tendo obtido luz verde.
Um mês depois de a obra ter sido iniciada, recebi da administração do HSJ uma proposta de Protocolo tripartido, para ser assinado pela Associação, pelo consórcio de construtoras e pelo próprio HSJ com a indicação de que os trabalhos seriam suspensos até que Protocolo fosse assinado.
Entre outras cláusulas inaceitáveis o documento responsabilizava-me pessoalmente pelo pagamento da obra (20,2 milhões de euros).
Repito. A administração do HSJ tinha-me pedido para assumir o Projecto do Joãozinho e tinha mesmo aprovado em conselho uma deliberação em que me agradecia por ter aceite. Agora, com um contrato de 20,2 milhões assinado pela Associação e a obra a correr, dizia-me assim: "Ou te atravessas pessoalmente ou então não deixamos avançar a obra".
A autora do documento, segundo a administração do HSJ, era a sua assessora jurídica Cuatrecasas, uma sociedade multinacional de advogados, com sede em Barcelona, e cujo escritório do Porto era liderado pelo então eurodeputado, agora ministro Paulo Rangel.
Durante um mês, procurei negociar, mas do HSJ deixaram de atender os telefones, ao passo que da Cuatrecasas me remetiam para o HSJ. Até que perdi a paciência e fiz aquele comentário no Porto Canal (cf. aqui).
O próprio TEDH reconhece ser um comentário contundente quando escreve (cf. aqui):
82. The Court observes that the statements made by the applicant contained serious accusations against P.R., suggesting that the terms of the MoU had been influenced by his political ambitions and thus attributing responsibility to him for the halting of the construction work on the paediatric wing of the hospital (...).
E, na realidade, foi um comentário contundente e produziu resultado. Dias depois, a Associação Joãozinho estava a negociar uma versão aceitável do Protocolo com a Cuatrecasas e com a administração do HSJ, a qual viria a ser assinada no final do Verão.
(Continua acolá)
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