Quando eu era miúdo e tinha a sorte de ir a um espetáculo de circo, o número dos palhaços incluía quase sempre uma dupla com o palhaço rico e o palhaço pobre. O rico trajado de lantejoulas e brilhantes, demonstrando autoridade e conhecimento e o pobre, andrajoso e desajeitado, mas esperto como um alho e sempre a passar a perna ao palhaço rico.
Como a vida em Portugal é um circo (deixem-me parafrasear o bardo - ˝All Life is a Play˝) lembrei-me do papel de palhaços que os médicos fazem no SNS, quando se verifica que, para as mesmas tarefas, o regime de trabalho e os vencimentos podem ser completamente diferentes. Os palhaços são todos iguais, mas há uns mais iguais do que outros – são os palhaços ricos e os palhaços pobres.
Vejam esta tabela das categorias profissionais dos médicos do sector público e arregalem os olhos:
1. Funcionários públicos do quadro a 40 horas com exclusividade. Eram os médicos que, por regra, não conseguiam ganhar a vida na privada e se encostaram ao sistema.
2. Funcionários públicos do quadro, a 35 horas, sem exclusividade. São os médicos que mantinham atividade privada por terem bom nome na praça.
3. Contratados por tempo indeterminado. São médicos que foram contratados no regime normal de trabalho, por salários que vão dos 10 aos 50 €/hora.
4. Contratados temporários.
5. Prestadores de serviços (através de empresas pessoais ou coletivas).
6. Tarefeiros por conta própria. São contratados para tarefas específicas, como 24 horas de urgência. O valor varia consoante a oferta e a procura – estilo Ryanair.
7. Tarefeiros fornecidos por empresas. (1)
Lado a lado, a executarem as mesmas funções, há disparidades gritantes. Há médicos a ganhar 1.500 a 2.000 €/ mês e colegas que faturam mais de 20.000 €/ mês.
Como assim?
É muito simples, o Ministério da Saúde desenvolveu um programa chamado adicional, para compensar trabalho extra e que é remunerado à peça:
Exemplo, com número arredondados:
— Intervenção às cataratas 200,00 € (chegam a operar 20 num dia).
— Prótese da anca 500,00 € (podem operar 4 numa jornada).
Como podem calcular, para manter boas listas no adicional é necessário preguiçar na rotina. Claro que deve haver honrosas exceções.
O funcionalismo público da pesada é o que mais beneficia e os novatos a contratos temporários e a tarefas são os mais prejudicados. Palhaços ricos e palhaços pobres.
Mas o Ministério da Saúde pactua com este descalabro?
— Não vou responder a perguntas ingénuas.
(1) Ninguém parece conhecer bem estas empresas de mediação, mas uma coisa é certa: não são de pessoas amigas dos governantes. ˝Por supuesto˝!
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