26 dezembro 2022

Um juiz da Diocese (27)

 (Continuação daqui)


"Abaixo a liberdade de fodê!"



27. O chulo

No mundo da prostituição idealizado pelo juiz Patto, cheio de horrores e tragédia, ao qual ele pretende pôr fim, existe uma figura que é especialmente maltratada e injustiçada, e essa figura não é a da prostituta, a qual aparece quase sempre como a vítima.

É a do chulo.

Na mente comunista do juiz Patto, existem sempre, em todas as situações da vida, explorados e exploradores, normalmente os explorados são os trabalhadores e os exploradores são os capitalistas. No negócio da prostituição estes papeis são desempenhados, respectivamente pela prostituta e pelo chulo, que o juiz Patto trata respeitosamente por proxeneta ou empresário do sexo (cf. aqui). Porém, na injustiça que é prestada ao chulo, o juiz Patto não está só, porque o chulo é, talvez, o agente económico menos compreendido de toda a história da humanidade.

Na sua versão clássica, o chulo é o amante da prostituta e também o seu empresário, prestando-lhe serviços distintos, cada um com o seu valor. Primeiro, o serviço de intermediação, permitindo à prostituta economizar nos chamados custos de transação, que consistem em anunciar e promover a sua actividade, encontrar clientes e acertar os termos de cada transação. 

O segundo serviço prestado pelo chulo é o serviço de segurança. A prostituição é um negócio arriscado, a prostituta não sabe nunca quem é que lhe vai aparecer pela frente. Ora, o chulo é precisamente o seu "guarda-costa" que zela pela sua segurança, e o "cobrador de fraque" que cobra o preço no caso do cliente se recusar a pagar o serviço.

Por estes dois serviços, o chulo precisa de ser remunerado no mesmo plano em que se remunera um agente imobiliário ou o segurança de uma discoteca. Mas existe uma razão adicional para o chulo ser remunerado que é a mais mal compreendida de todas e à qual, incidentalmente, já fiz referência. 

É que, na sua versão clássica de amante da prostituta, o chulo dá à prostituta aquilo que  nenhum dos seus clientes lhe dá - amor. É o chulo que dá à prostituta aquilo que o juiz Patto lamenta não existir na relação entre ela e qualquer um dos seus clientes - amor genuíno, amor romântico, amor conjugal, já que, com os clientes, ela só tem sexo.  

Compreende-se agora por que é que a prostituta está disposta a pagar ao chulo. Não é só pelos serviços de intermediação e de segurança que ele lhe fornece, é também pelo amor que ele lhe dá, e ela estará disposta a pagar-lhe tanto mais quanto maior fôr o amor que ela sente que ele lhe dá. No limite, uma prostituta loucamente apaixonada pelo seu chulo, dar-lhe-á tudo aquilo que ganha.

Porém, não fazendo caso disto e, em particular, da relação espiritual entre ele e a prostituta, ficou na mente popular a ideia do chulo como alguém que recebe desproporcionalmente face àquilo que dá e, no limite, a ideia de que o chulo só recebe e não dá nada em troca - qualquer homem, para ter sexo com a prostituta, tem de lhe pagar, ao passo que o chulo tem sexo de borla e ela ainda lhe paga por cima.

Esta ideia ficou de tal modo arreigada no espírito popular que um amigo meu, sempre que se fala de impostos, grita "Eles chulam-nos!", querendo com isso significar que os políticos nos levam mais em impostos do que aquilo que nos dão em serviços públicos. A secretária de Estado que, recentemente, querendo vir embora da administração da TAP, ainda recebeu uma indemnização de meio milhão de euros (cf. aqui) "anda, obviamente, a chular-nos". O patrão que paga a um empregado para ele desempenhar uma certa tarefa, mas ele raramente aparece ao serviço, vai um dia despedi-lo, dizendo-lhe "Tu és um chulo, pá!".

E o que dirão os contribuintes de um juiz a quem pagam  generosamente para ele estar no tribunal a produzir serviços de justiça - que estão cronicamente atrasados -, e ele, em lugar disso, utiliza uma boa parte do tempo, que devia ser dedicado ao trabalho, ao serviço de outras instituições e a promover outras actividades de carácter político, social e religioso, incluindo comícios, que nada têm a ver com o serviço público de justiça?  

O que dirão dele os contribuintes?


(Continua)

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