01 fevereiro 2022

democracia-católica

O fim do CDS abriu ao Chega o espaço da direita conservadora, já que a Iniciativa Liberal se apresenta como um partido do centro.

Partido de direita no Parlamento, neste momento, só há um - o Chega. Assim o Chega saiba aproveitar doutrinalmente esta oportunidade e ocupar este espaço - o espaço da democracia cristã -, que é um espaço que o CDS nunca conseguiu segurar.

Existe uma forte razão para o falhanço do CDS. Durante os anos 70 a 90,  a democracia cristã nos países de tradição católica, como Portugal, estava em crise devido ao Concílio Vaticano II e à desorientação intelectual que se lhe seguiu acerca do que era e do que não era catolicismo.

Toda a gente e todas as ideias se reclamavam do catolicismo, incluindo o marxismo, de que o exemplo mais extremo é a célebre teologia da libertação que, tendo origem na Alemanha, esteve muito em voga na América Latina, sobretudo no Brasil durante os anos 80. A própria Encíclica Laborem Exercens (1981), a primeira do Papa João Paulo II sobre temas económicos, dedicada ao Trabalho Humano, ficava a pouca distância de recomendar a luta de classes.

Não surpreende que em todos os países católicos, a democracia-cristã estivesse em profunda crise. Em Itália, o Partido da Democracia Cristã desapareceu e, em Portugal, o CDS tornou-se cada vez mais um partido social-democrata a tal ponto que alguns dos seus mais destacados fundadores, como Freitas do Amaral e Basílio Horta, acabaram mesmo no PS.

Um facto discreto ocorrido em 1992 alterou radicalmente esta situação. Foi a publicação do Catecismo da Igreja Católica pelo Papa João Paulo II. Esta obra monumental foi elaborada por uma comissão de teólogos presidida pelo então Cardeal Joseph Ratzinger, mais tarde Papa Bento XVI. Ainda hoje, o Papa Emérito considera o Catecismo a obra mais importante da sua vida.

Há 500 anos que a Igreja Católica não publicava um Catecismo e daí a anarquia intelectual em que o catolicismo viveu nos últimos séculos. A partir de agora, porém, aquilo que é catolicismo e aquilo que não é catolicismo está perfeitamente definido. É catolicismo aquilo que está no Catecismo, não é catolicismo aquilo que está fora dele.

A partir de agora é possível desenvolver uma doutrina moderna da democracia-católica em bases seguras, algo que não era possível antes de o Catecismo ser divulgado e que explica o falhanço dos partidos democratas-cristãos fundados depois da Guerra nos países de tradição católica.  

O doutrinador de referência da nova democracia-cristã nos países de tradição católica, como Portugal, é Joseph Ratzinger.

Aquilo que distingue o Chega dos outros partidos é a sua raiz católica. Os partidos socialistas portugueses (PS, PSD, BE, PCP) têm todos uma raiz protestante (luterana). Quando a Iniciativa Liberal se aproxima dos partidos socialistas na questão dos costumes (v.g., homossexualidade, eutanásia) ela está a exibir também a sua raiz protestante, embora de natureza calvinista.

O Chega, se for bem trabalhado doutrinalmente, e agora que o CDS desapareceu, vai ser o grande partido conservador que a democracia portuguesa nunca teve. Ele será o partido que exprime a identidade portuguesa e as suas tradições porque uma das grandes diferenças entre catolicismo e protestantismo é precisamente a Tradição.

Para o protestantismo só existe uma fonte da revelação - a Bíblia. Deus revela-se através da Bíblia e só da Bíblia (o principio protestante Sola Scriptura). Para ao catolicismo existem duas fontes da revelação, a Bíblia e a Tradição, sendo a Tradição o processo através do qual, ao longo dos séculos, o povo interpretou o cristianismo bíblico que permite ajustá-lo à realidade presente, assim mantendo o cristianismo sempre actual.


Nota: Eu sou membro do Gabinete de Estudos e da Comissão Política Nacional do Chega. Porém, as opiniões aqui expressas vinculam-me apenas a mim e não também o Chega.

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