05 agosto 2020

Os milagres de S. Branquinho (VI)

(Continuação daqui)


VI. O milagre da obliteração


O terceiro milagre de S. Branquinho foi o de conseguir que, até 2014, os milagres que realizou em Valongo entre 2003 e 2007 não chegassem aos ouvidos da Inquisição, mesmo se a Inquisição possui olheiros em todos os recantos do país, incluindo Valongo.

Em 2014, a política da Inquisição, segundo a qual "Os blogues é uma vergonha" (cf. aqui) já tinha sido largamente relaxada. Na realidade, poucos anos depois, os inquisidores não queriam outra coisa, passavam o tempo nos blogues e nas outras redes sociais. A tal ponto que a hierarquia teve de emitir uma directiva proibindo-lhes o acesso à internet durante as horas de trabalho (cf. aqui). A directiva começava assim: "Meninos... não vejam tanta internet … faz mal à vista….".

Não obstante, os milagres de S. Branquinho chegaram aos ouvidos dos inquisidores através dos jornais, disso não restam hoje dúvidas.

A palavra à jornalista Mariana Oliveira no seu artigo de sexta-feira passada no Público:

"Apesar do licenciamento e da construção do hospital terem ocorrido entre 2003 e 2007, esta investigação só foi aberta em 2014, na sequência de um grande trabalho do PÚBLICO (…)"
(cf. aqui, p. 15 da edição em papel, ênfase meu)

Agora, outra vez a palavra à jornalista Mariana Oliveira no seu artigo de ontem no Público que, além dos milagres de 2003-2007, imputa a S. Branquinho mais dois milagres, o de fraude fiscal e o de branqueamento de capitais:

"Os indícios de fraude fiscal e branqueamento surgiram no âmbito deste inquérito aberto em 2014, na sequência de um grande trabalho do PÚBLICO (…)"
(cf. aqui, p. 13 da edição em papel, ênfase meu).

Perante esta dupla evidência - a de que os inquisidores tomaram conhecimento dos milagres de S. Branquinho na sequência de um grande trabalho do PÚBLICO - fica demonstrado à saciedade que, enquanto os antigos inquisidores tinham de andar por aí, país fora, à procura de milagres, os novos inquisidores ficam sentados à espera que os jornais e as redes sociais lhes tragam os milagres aos seus gabinetes de trabalho.

Foi o que aconteceu naquela manhã de primavera, 18 de maio de 2014.

O procurador Nuno Serdoura - hoje Procurador da República, com 3 anos, 4 meses e 2 dias de experiência na função, 553º na lista de antiguidades (cf. aqui, p. 169) - estava sentado no seu gabinete do DIAP do Porto a tomar café e a fumar um cigarro, enquanto lia os jornais da  manhã.

De repente, deparou-se com o grande trabalho do PÚBLICO que relatava os milagres de S. Branquinho em Valongo entre 2003 e 2007. Deu um salto na cadeira e, alvoroçado, disse para a sua colega, a procuradora Ana Margarida Santos, que fazia tricot sentada na cadeira ao lado:

-Guida... temos de nos despachar!...

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