"Um partido de direita nacional terá de ser uma vanguarda consciente deste contexto, outra vez "exótico", outra vez de "excepção". E de se guiar por três tipos de valores: valores nacionais e patrióticos - defesa da independência nacional frente a europeísmos e iberismos; valores de orientação religiosa e familiar - contestação da imposição da agenda LGTB e de outras pretensões civilizacionalmente transformistas; valores justicialistas - defesa de uma economia de mercado, com mercado livre mas temperadas por medidas sociais de equilíbrio, de protecção dos mais débeis e de reequilíbrio da distribuição de riqueza" (cf. aqui).
Num post anterior referi que o principal, talvez o único erro do excelente artigo do Jaime Nogueira Pinto está "no partido". Ele não consegue libertar-se da ideia de partido. No pensamento político actual, a ideia de partido é como o vício do álcool, ninguém consegue libertar-se dele - encontram-se sempre razões para beber.
O Jaime Nogueira Pinto defende aquilo que, sem grande margem para discórdia, são valores tradicionais portugueses - a nação, o catolicismo e a família, a liberdade económica, a caridade. Mas, precisamente, porque são valores da tradição portuguesa, valores comunitários e que pertencem a todos os portugueses, é muito difícil promovê-los sob a forma de partido. Na realidade, é uma contradição nos termos.
O partido - está na própria palavra - parte, fractura a comunidade, separa-a em duas partes acerca de uma ideia. Eu posso fazer um partido promovendo a ideia de nação, mas em breve terei adversários - todos aqueles que não dão valor à ideia de nação -, e acabo a fracturar a nação, que é exactamente o oposto daquilo que pretendia fazer.
Eu posso fazer um partido para defender a causa LGTB. Terei muito mais dificuldade em mobilizar pessoas para fazer um partido que promova a família tradicional. Porquê? Porque ninguém acha a ideia interessante.
Um partido católico em Portugal - um país que é dos mais católicos que existe no mundo - está condenado ao falhanço. Um partido budista terá muito mais sucesso. Na realidade, os dois maiores partidos em Portugal - PS e PSD - são partidos luteranos, só que nunca falam de Deus. E o CDS, que começou católico, teve de virar luterano por razões de sobrevivência.
Eu consigo imaginar um partido tendo como ideia central promover os animais, e nem sequer tenho de dar grandes voltas à imaginação. Um partido destinado a promover pessoas é que tenho mais dificuldade em imaginar.
Eu sinto-me capaz de fazer um partido para promover a ideia de que as casas no Algarve devem ser pretas, com base em "argumentos científicos" sofisticados. Mas eu terei grande dificuldade em fazer um partido que promova a ideia de que as casas no Algarve devem ser brancas.
Porquê? Porque elas já são brancas, é essa a tradição.
A principal tradição - uma palavra que significa "transmissão" - da humanidade é a da vida. É transmitida por homens e mulheres, desempenhando as mulheres um papel mais importante que os homens nesta tradição. Não conheço uma jovem mulher que aceite ser parecida com a mãe e sou capaz de imaginar um partido de jovens mulheres a promover a ideia de que as mulheres são diferentes das mães. Aquilo que eu não consigo imaginar é um partido das mães a promover a ideia de que as filhas são parecidas com elas.
Porquê? Porque é a verdade (cf. aqui).
Os partidos evoluíram a partir das seitas protestantes e aquilo que as seitas protestantes fizeram, e ainda hoje fazem, é contestar a tradição, representada pela Igreja Católica. Os partidos são instituições criadas para contestar a tradição, não para promovê-la.
4 comentários:
"aquilo que as seitas protestantes fizeram, e ainda hoje fazem, é contestar a tradição, representada pela Igreja Católica"
Concordo consigo, pelo menos no papel e no que é oficial assim é a Igreja.
Desde o Vaticano II o que aconteceu foi a hierarquia a abandonar a tradição, a partir daí de facto dentro da Igreja surgiram os partidos: liberais/progressistas, conservadores, tradicionalistas, sedevacantistas, etc.
Qual a sua opinião sobre o caminho que a Igreja Católica tem levado nos últimos 50 anos?
A Verdade e a tradição continuam na Igreja e é ela quem as defende e promove mas na prática dificilmente vemos um padre ou bispo a falar sobre a Verdade e a tradição. Pelo contrário, o que ouvimos é como indica para os partidos: "começou católico, teve de virar luterano por razões de sobrevivência."
"O DN voltou a questionar o Ministério Público para confirmar se esta queixa que a PSP classificou de "risco elevado" foi a mesma que acabou arquivada e classificada apenas como um episódio de "coação e ameaça". A Procuradoria Geral da República respondeu dizendo que nada tinha a acrescentar à informação inicial"
https://www.dn.pt/pais/interior/violencia-domestica-e-risco-elevado-psp-alertou-ministerio-publico-em-2017-10539260.html
O Diabo à solta.
Uma outra pretensão civilizacionalmente transformista é o crescimento da interferência da sociedade (famílias, Estado) na família a propósito da violência doméstica. Prova-o o número de condenações por violência doméstica, o facto de dos 15 elementos do Conselho de Magistratura apenas 4 entenderem que o Dr. Neto de Moura deveria ser multado, etc.
Uma mudança para um regime sem partidos teria de implicar o fim desta transformação civilizacional, certo?
Dizer que a violência doméstica mata o sonho de constituir família é como dizer que a sinistralidade rodoviária mata o sonho de ter carta de condução, de andar na estrada e de viajar. Temos a responsabilidade de evitar os acidentes; não vamos deixar de conduzir por causa disso.
Imagine um rapaz de 20 e tal anos que se envolve com uma mãe divorciada de 30 (1 filho de 5 anos). Constituem família e têm filhos em comum. A criança do casamento anterior está em guarda partilhada, uma semana em cada casa. O ex-marido aceita a situação, colabora com a ex-mulher em tudo, e ao fim de algum tempo constitui nova família ele próprio.
Como é que estas pessoas voltam à Verdade e à Tradição?
O que diz a Tradição sobre este caso? (Não foi um padre, é certo, foi o actualidadereligiosa.blogspot.com.) Uma pessoa que foi abandonada deve aceitar a situação nova? Não, pois é ela que está no direito. As famílias católicas devem aceitar de ânimo leve que amigos seus se divorciem, separem, etc.? Não.
Talvez um padre fosse mais compreensivo, talvez os activistas do blogue estejam a comportar-se como protestantes, pois a Igreja acolhe todos. Mas o que é que a Tradição pensa sobre estas pessoas?
A mãe destruiu um lar. O rapaz é conivente com a situação, aproveitando-se da esposa que era de outro. E o outro é um panhonhas, que não lutou pela sua família e aceitou cobardemente uma colaboração desonrosa, a sua filha a ter cuidados paternais de outro à semana. (No limite, a Tradição diria que, se o outro pegasse numa pistola e deixasse ali uns quantos mortos, a culpa era desta sociedade permissiva e sem valores. Ainda que a Verdade não o dissesse, a Tradição teria lá uma alínea no bolso com esta nota.)
Note-se que estas pessoas não estão nada distantes da Verdade e da Tradição. Todos prezam o valor da Família (e vivem num país católico, logo vivem como querem, certo?) Mas que incentivo têm para voltar?
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