A reacção do Governo espanhol ao movimento independentista da Catalunha tem posto a descoberto aquela relação entre o poder político e as pessoas que é muito típica dos países de tradição católica e que constitui o maior obstáculo ao funcionamento da democracia nestes países.
É uma relação entre soberano e súbditos em que a vontade prevalecente é a do soberano e em que os súbditos são obrigados a acatar a vontade do soberano: "A Catalunha pertence a Espanha e vocês, catalães, vão ter de viver connosco, quer gostem quer não gostem, a bem ou a mal".
A relação democrática é inversa, é uma relação de subordinação do poder político à vontade das pessoas (verdadeiros cidadãos, e não meros súbditos), em que o poder político se submete e executa a vontade dos cidadãos, exemplificado pelos referendos independentistas na Escócia e, antes, no Québec: "A Escócia pertence em primeiro lugar aos escoceses e só depois ao Reino Unido. Decidam lá se querem viver sós ou em união connosco. Respeitaremos e executaremos a vossa vontade".
Parece-me evidente, nos tempos que correm, que Madrid vai perder a batalha e a Catalunha se tornará independente. Se o confronto chegar - e ele já esteve mais longe - o agressor é Madrid. Os catalães estavam em casa deles. A opinião pública mundial ser-lhes-á esmagadoramente favorável.
A Catalunha pertence, em primeiro lugar, aos catalães, e só depois a todos os outros espanhóis.
O leitor Rui Alves chamou-me a atenção para uma coincidência que pode estar a dar-se 500 anos depois. Há 500 anos foram os protestantes (na realidade, eles eram inicialmente católicos, como Lutero) do norte da Europa que puseram fim à unidade católica da Europa. Agora, podem ser os católicos do sul a pôr fim à unidade da Europa engendrada pelos protestantes.
Sem comentários:
Enviar um comentário