05 setembro 2017

irmãos

Se há pessoa acerca da qual eu sempre tive dificuldade em falar no âmbito do Projecto Joãozinho era  do novo presidente do Hospital de S. João, Dr. António Oliveira e Silva.

A minha principal dificuldade não era sequer a de saber que ele acompanhava a redação deste livro no blogue Portugal Contemporâneo enquanto eu o ia escrevendo -  a partir de certa altura, provavelmente, com redobrado interesse porque era a altura em que ele ia entrar em cena.

Encontrámo-nos pela primeira vez, a meu pedido, em Abril de 2016, ele tinha tomado posse há menos de dois meses. A obra estava parada há um mês e os trabalhos de desimpedimento do espaço por parte do HSJ há quase cinco.

Eu ia pedir-lhe que o HSJ cumprisse aquilo que assinou e desimpedisse o espaço a fim de que a Associação pudesse continuar a obra. Falei-lhe também do trabalho que a Associação tinha desenvolvido nos últimos dois anos e que garantia a construção da nova ala pediátrica do HSJ por via mecenática.

Respondeu-me que não tinha onde colocar o Serviço de Sangue e eu não gostei da resposta. Poucas semanas mais tarde, a Maria do Céu também não viria a gostar. Se o argumento poderia ter alguma ponta de credibilidade na altura, agora - passado ano e meio - não tinha nenhuma, e o espaço continuava por desocupar. Era uma desculpa de mau cumpridor.

Disse-me que era amigo do professor António Ferreira - são ambos médicos de Medicina Interna do HSJ - e eu também não fiquei entusiasmado com a informação. Disse-me também que era a primeira vez que estava na administração de um hospital, e isso eu gostei de ouvir. Na terminologia que eu utilizara no livro "F." para a minha neta Francisca, ele era, aos meus olhos,  um "pirata bom" que não tinha tido tempo nem oportunidade para se converter ainda em "pirata mau".

Senti que ele tinha herdado da administração do professor António Ferreira a ideia de que o projecto Joãozinho, tal como concebido pela Associação, era para "matar", e em algumas entrevistas que deu para a comunicação social foi mesmo explícito acerca disso. Durante o ano de 2016, as coisas não correram nada bem entre nós, sobretudo por causa do Dossier Continente - um assunto que deixarei para mais tarde.

Pelo final do ano, ele falava para a comunicação social como se eu não existisse e a Associação Joãozinho também não, e dizia que a obra iria ser feita pelo Estado e paga pelo Estado. O Ministro da Saúde, sem nunca se comprometer, como é apanágio dos políticos, sugeria o mesmo. Aguentei uns meses difíceis, enquanto, ao mesmo tempo, pensava: "Não sei onde é que eles vão fazer a obra - só se fôr no ar - e como é que a vão pagar - só se fôr com vento...".

Mas havia um pormenor que me ia habituando a apreciar no Dr. Oliveira e Silva à medida que o conhecia melhor. Dava sempre a cara e cumpria os compromissos que assumia comigo, e isso era uma mudança radical em relação ao professor António Ferreira, que me induzia  frequentemente a actuar e a assumir compromissos e, no momento de ele também os assumir, desaparecia.

Um dia, ainda em 2014, já cansado de ficar com cara de cão de loiça perante terceiros, consegui arranjar um jantar com a direcção da Apifarma, que incluia os gestores das principais multinacionais farmacêuticas. A ideia era pedir-lhes que, em lugar das contribuições ao Joãozinho virem individualmente de cada empresa, viessem globalmente através da Apifarma.

O Manuel Eanes achou a ideia genial e eu pedi-lhe que, por já estar escaldado, fosse ele a combinar o jantar. A presença do professor António Ferreira era essencial. E ele assim fez. Falou com o professor António Ferreira que se disponibilizou imediatamente para estar presente. Da minha parte, qualquer data seria boa. Depois, foi junto do presidente da Apifarma marcar a data, o qual, por seu turno, teve de arranjar as coisas junto dos outros membros da direcção.

Quando tudo estava combinado para o jantar que teria lugar dali por dez ou doze dias, o Manuel Eanes nunca conseguiu encontrar o professor António Ferreira, o telemóvel não atendia, no Hospital ninguém sabia dele, desapareceu durante semanas. Na véspera, o Manuel Eanes viu-se obrigado a cancelar o jantar junto do presidente da Apifarma. Um embaraço.

Passou agora quase ano e meio sobre o dia em que conheci o Dr. Oliveira e Silva e julgo que nos aproximámos bastante ao ponto de, pelo menos da minha parte, eu sentir que somos irmãos. Existe um propósito grandioso que genuína e verdadeiramente nos une - o de fazer a nova ala pediátrica do Hospital de S. João. E eu próprio lhe cheguei a dizer: "Eu e o senhor - os dois a trabalhar em conjunto - faríamos isto num instante...".

Mas há um ponto que nos separava, e que respeitava à missão que cada um de nós já trazia consigo no dia em que nos conhecemos. A minha era exigir-lhe que desimpedisse o espaço para que a Associação pudesse continuar a obra. A dele era pôr-me dali para fora bem como à Associação Joãozinho.

3 comentários:

Luis Caldas disse...

Caro Pedro, estou a acompanhar com muito entusiasmo o seu livro que sigo fielmente. Espero que venha a ter um final feliz, apesar de ser muito pessimista no que se refere a tudo do estado.

Já tentei contar partes desta história a amigos do sul, falta é aqui no blog uma compilação para sugerir de inicio de leitura a estes mesmos.

Maria Sousa disse...

Comecei a seguir o seu blog e visito-o todos os dias e, apesar do ficar triste com esta história, louvo a sua coragem de enfrentar gente "pequenina" sem carácter, capaz de tudo para manter os seus interesses intocáveis. Bem haja por isso. Ah! com as esganiçadas não se amofine, não merecem o seu tempo.

Anónimo disse...

Absolutamente fascinante, esta história. Rezo por um final feliz, naturalmente uma inauguração de pompa e circunstância com todos os politiqueiros que a tentam hoje boicotar, mas com um Pedro Arroja sorridente, qual Lucky Luke a cavalgar em direcção ao pôr do sol.

A melhor homenagem serão as crianças hospitalizadas a lerem as histórias do Peter Throw, em versão banda desenhada!

melhores cumprimentos,
daniel