Estávamos em meados de Setembro. A minha prioridade era agora a de chegar ao Secretário de Estado Manuel Delgado e deitar a mão àquele Parecer, já que as portas do Hospital de S. João se tinham fechado.
A minha secretária iria agora iniciar, junto das suas congéneres do Ministério da Saúde, a mais dura de todas as batalhas que travou ao serviço do Joãozinho - marcar a reunião com o Dr. Manuel Delgado.
Ao fim de mais de um mês, fazendo prova da mais vigorosa persistência, e depois de se ter pegado por mais do que uma vez com as secretárias do Ministério da Saúde - que arranjavam todas as desculpas para inviabilizar a reunião -, foi ela a prevalecer. A reunião acabaria por ser marcada para 27 de Outubro.
É altura de lhe prestar uma pequena homenagem e um agradecimento. Por esta altura, a obra estava parada há mais de seis meses e a Associação estava praticamente paralisada. Eu não saía para a rua a angariar mecenas com a obra parada. Todos os eventos que tínhamos planeado em nome do Joãozinho foram cancelados. Os acordos de mecenato foram suspensos. Acabámos por dispensar a única funcionária que a Associação tinha.
Todo o trabalho do Joãozinho passou agora a ser desempenhado pela minha secretária, que secretariava também outras pessoas dentro da minha empresa. Para além do trabalho, e não era pouco, que tinha de prestar à empresa que lhe pagava, ela assumia agora todo o trabalho da Associação Joãozinho sem um gesto de desagrado, e cumprindo-o com a eficácia e o sentido de missão que todos lhe reconhecíamos.
O Joãozinho tinha muitos mecenas como ela, que não podiam dar mais do que o seu trabalho e o seu tempo - ou às vezes até uma simples palavra de incentivo - mas que o faziam com toda a generosidade e determinação. Escusado será dizer, ela também era mãe, e as mães foram desde sempre as mais sensíveis e as mais dedicadas mecenas do Joãozinho.
Ainda ela estava a lutar para conseguir a minha reunião com o Secretário de Estado, e caía mais uma bomba sobre mim e a Associação Joãozinho. A jornalista Margarida Gomes publicava no Público um artigo de página inteira, e com chamada de primeira página, com o título "Joãozinho tenta fazer negócio com o Continente com terrenos que são do Estado".
Na véspera, a Margarida Gomes tinha-me telefonado para falar sobre o Dossier Continente. Dei-lhe todas as explicações e contei-lhe toda a história. Enviei-lhe o dossier por e-mail tal como o tinha remetido ao HSJ e ao Ministério da Saúde. Estava lá toda a informação e a informação verdadeira. À tarde, fez-me várias perguntas por e-mail e passei mais de uma hora a responder-lhe, e-mail cá, e-mail lá.
Como é que ela podia escrever uma coisa daquelas, sugerindo que eu tinha andado a traficar terrenos do HSJ com o Continente, sem conhecimento da administração do HSJ?
Conheci-a mais de um ano antes a propósito do episódio do protocolo e do meu comentário no Porto Canal sobre o Paulo Rangel e a Cuatrecasas. Entrou-me pelo escritório dentro a fazer-me perguntas como se eu fosse um inimigo do Hospital de S. João. Vinha directa do Hospital.
Eu nem podia acreditar no que lia agora. Mas houve um pormenor que, verdadeiramente, me interessou. Eu andava concentrado em chegar ao Parecer do Vasco Moura Ramos. No artigo da Margarida Gomes, ele aparecia a falar sob anonimato e referia-se ao seu próprio trabalho, não como um Parecer, mas como uma "apreciação preliminar". Ora, existe uma diferença abissal entre as duas coisas. A um Parecer pode atribuir-se valor jurídico, mas uma "apreciação preliminar" não tem nenhum.
Na véspera da minha reunião com o Secretário de Estado, em que ia finalmente ter acesso ao Parecer, ou "apreciação preliminar" ou lá o que fosse, pedi à minha secretária para informar a sua congénere do Ministério da Saúde que iria acompanhado do Eng. Vergílio Folhadela, Presidente do Conselho de Mecenas da Associação Joãozinho, que nesse dia se encontrava casualmente em Lisboa.
A secretária do Ministério da Saúde respondeu-lhe que nem sequer tinha tomado nota daquela reunião na agenda do Senhor Secretário de Estado e que, portanto, o Senhor Secretário de Estado teria no máximo cinco minutos para me atender.
Perante aquela informação inesperada, e enquanto mantinha a linha com o Ministério da Saúde, ligou-me pelo telefone interno para o andar de cima para me comunicar a notícia e saber a minha reacção:
-Diga-lhe que eu vou de propósito do Porto a Lisboa para falar com o Senhor Secretário de Estado... nem que seja só por um minuto!...
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