Foi através de um primo que o conheci. Ele ainda mandou dizer que me dirigisse à Fundação, que é o braço solidário do grupo. Respondi pelo primo que não, que tinha uma obra para fazer, mas era para pagar. Nunca me ocorreria pedir a uma construtora que me fizesse gratuitamente uma obra daquela dimensão.
Dias depois estava no gabinete do Eng. Arnaldo Figueiredo, vice-presidente da Mota-Engil. Foi uma pequena viagem de seis quilómetros entre o meu escritório e a sede da empresa, sempre à beira-rio. Ele conhecia o assunto que era falado há vários anos na cidade do Porto e o primo tinha-lhe transmitido as últimas informações.
Disse-lhe que tinha acabado de tomar posse como presidente da Associação Joãozinho. Queria que a Mota-Engil me fizesse aquela obra. O projecto de arquitectura e engenharia já existia no HSJ. O Estado não a fazia, muito menos agora em período de austeridade. Tínhamos de ser nós a fazê-la, pessoas como eu e ele, a quem a vida de algum modo tinha sorrido. Não podíamos deixar eternamente crianças doentes internadas naquele miserável barracão.
E as mães... Há mães que não saem de lá da cabeceira dos filhos. Da primeira vez que lá fui, uma criança recém-nascida estava no isolamento, a mãe debruçada sobre o berço. Nem reagiu ao ruído que fizemos à entrada. Devia estar ali há vários dias, sentada numa cadeira de pau, sem lugar para descansar ou sequer fazer a sua higiene pessoal.
Expliquei-lhe por que estava a fazer esta obra. Era uma maneira de agradecer a quem na vida me deu crianças também. Pedia a ajuda dele. O Eng. Arnaldo Figueiredo tinha três filhos e a esposa estava naquele momento a atravessar um pequeno problema de saúde.
Em breve se gerou uma certa convergência de espírito entre nós. Enquanto as mulheres cuidam dos filhos -, porque é a elas que eles recorrem -, temos de ser nós, homens, a arranjar dinheiro para a casa. E era de uma casa que se tratava. Uma casa para crianças doentes e também para as mães que as acompanham.
O único dinheiro que tinha era um milhão e tal de euros que o HSJ iria transferir para a Associação, fruto das contribuições recebidas durante os cinco anos em que o Projecto Joãozinho esteve sob a sua direcção.
Eu próprio iria angariar o dinheiro que faltava - e era quase todo. Mas precisava crucialmente da obra a andar; com a obra à vista ninguém iria recusar contribuir para um hospital de crianças. Sem obra é que tudo seria muito mais difícil.
Aquilo que eu lhe vinha pedir era que a Mota-Engil fizesse a obra e a financiasse. Eu pagaria a prestações em dez anos. A Associação não tinha garantias para dar. A única garantia que podia dar era a minha palavra. Aos 60 anos de idade, não devia nada a ninguém e todas as empresas que tinham o meu nome também não deviam nada a ninguém.
A conversa foi longa, envolveu assuntos de carácter pessoal para dois homens que se encontravam pela primeira vez, mas, à medida que ia decorrendo, eu apercebi-me que, a partir de certa altura, já não era só eu que queria aquela obra.
Havia só um problema. Como é que o Eng. Arnaldo Figueiredo iria apresentar o assunto à administração? Não faltavam pessoas a bater à porta da Mota-Engil com obras para fazer e sem dinheiro para as pagar.
Sugeriu-me então que falasse à Dra. Manuela Eanes e à Dra. Manuela Mota. Talvez elas pudessem fazer alguma coisa. Despedimo-nos amistosamente. E eu cheio de esperança.
A primeira manifestação de Deus nesta obra - reconheceria eu mais tarde - chegou através do Eng. Arnaldo Figueiredo, vice-presidente da maior construtora do país e uma das suas raras multinacionais.
Uma semana depois, duas após a minha tomada de posse, aconteceu o primeiro milagre.
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