"Darei um exemplo grosseiro do que pretendo dizer. Suponhamos que um habitante da lua - uma criatura conhecedora da matemática - se põe a apreciar o corpo humano; aperceber-se-á imediatamente de que o aspecto essencial do corpo humano é a duplicação: cada pessoa é duas pessoas, e a da direita assemelha-se com grande precisão à da esquerda. Tendo reparado que existe um braço do lado direito e um braço do lado esquerdo, uma perna do lado direito e uma pena do lado esquerdo, o tal habitante da lua poderá prosseguir a sua investigação, e chegar à conclusão de que existe o mesmo número de dedos de cada lado, quer nas mãos, quer nos pés, um par de orelhas, um par de narinas, e até um par de lobos no cérebro.
Acabará então por concluir que essa duplicação é uma lei; de tal maneira que ao detectar que existe um coração de um lado, deduzirá que também existe um coração do outro lado. E é aí, no momento em que tem mais certeza de estar certo, que se engana.
É este silencioso desvio - um desvio mínimo - da precisão esperada, que constitui o elemento inquietante de todas as coisas."
(G. K. Chesterton, Ortodoxia, Lisboa: Aletheia, 2008, pp. 115-16)
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