12 março 2016

as duas coisas

Um dos maiores erros que se pode cometer acerca do cristianismo é o de olhar para Cristo como sendo somente Deus. Porque ele não era somente Deus. Ele também era homem.

Ele era as duas coisas. Ele era ao mesmo tempo homem e Deus.

Nunca nenhuma comunidade humana existiu sem Deus, e algumas até tiveram vários. Nuns casos eram homens, como na Grécia ou na Roma antigas (mas também havia mulheres). Mas mesmo esses deuses que eram homens, nunca ninguém os viu em concreto, nunca ninguém viveu com eles ou falou com eles, e nunca ninguém lhes tocou. Deus era um figura remota, um homem que nunca ninguém tinha visto ou tocado. E o Deus do judaísmo é também assim, um legislador remoto.

Uma das grandes novidades do cristianismo é que Deus é um homem concreto, com quem se convive, com quem se fala, em quem se toca, como fez S. Tomé. É uma figura histórica, um homem concreto que existiu de verdade, em carne e osso. A tal ponto concreto que durante os primeiros 30 anos da sua vida nunca ninguém deu por ele.

Em Cristo existiam características que eram  humanas e outras que eram divinas. É muito interessante o exercício de ler os Evangelhos olhando para Cristo somente como homem. As suas falhas ou pecados humanos são numerosos.

Então não é que aquele patife proclama alto e bom som o princípio segundo o qual quando nos derem uma bofetada numa face, devemos oferecer a outra face, e ele próprio, quando lhe dão uma bofetada numa face (durante o seu julgamento, por um guarda) em lugar de oferecer a outra face, protesta?

E o que dizer daquele episódio, em que estando ele com os discípulos, o vêm avisar que lá fora está a sua mãe, e ele pergunta insolente "Mas quem é a minha mãe?" de modo que, parece, a própria mãe ouviu?. Que ofensa à mãe. Eu estou a imaginar-me na situação. A minha mãe avançaria para mim, zangada, e dir-me-ia:

-Perguntaste quem era a tua mãe?...

-A tua mãe sou eu!,

e eu ficaria calado que nem um rato.

E aquela cena do templo, em que ele entra e vira as mesas dos cambistas espalhando a mercadoria toda pelo chão? Se eu estivesse de lado a observar, não lhas pouparia: "Eh pá, tinhas alguma necessidade de fazer isso? Os homens estão aí a governar a sua vida e das suas famílias. Bastava que lhes tivesses dito: 'Ponham-se lá fora, que aqui não é lugar para negócio'".

E aquela rajada de insultos que ele dispara sobre os fariseus e os escribas em Mateus:23? Para quem proclamava que devíamos sempre amar o próximo...

Quanto ao sexo, sendo homem, ele tinha tanta necessidade de ter uma mulher como qualquer outro homem. Mas, depois, havia também a característica divina nele - e essa era a sua capacidade de contenção.

A ideia moderna de que Cristo é somente Deus é uma ideia protestante, que decorre do princípio Solo Christus. Se Cristo é somente Deus, e eu sou homem, então ele é totalmente diferente de mim e largamente irrelevante para a minha vida. Daqui a fechar Cristo no armário e viver como se Deus não existisse vai um passo.

A verdade pertence ao catolicismo - Cristo é, ao mesmo tempo, Deus e homem. Este Cristo é relevante para a vida, e para a vida de todos os dias. Eu também sou homem como ele. A próxima questão é a seguinte: o que é que me falta, então, para ser também Deus como ele? Ele passa a ser o padrão, o guia da minha vida.

Ele não sugere nada aos homens que sejam castos. Pelo contrário, ele encoraja a procriação - crescei e multiplicai-vos. Mas através daquela característica divina da castidade, ele passa uma outra, e grandiosa, mensagem: "Olha que uma mulher não é só para sexo, nem, em primeiro lugar, para isso".

Nunca os homens tinham recebido esta mensagem através do exemplo de um homem como eles. Se a tinham recebido antes, era só de conversa fiada. Cristo possuía também essa caraterística divina. Ele não dizia apenas. Ele fazia, dava o exemplo.

Que tipo mais extraordinário!

23 comentários:

zazie disse...

Não é por nada, mas esquecem-se sempre da pombinha
eeheh
O Espírito Santo é teoricamente o case study mais curioso na Trindade

":OP

A sério. Estou a brincar e a falar a sério. É por aí que a ponte com a filosofia se faz -a psickê, a pneuma.

Ricciardi disse...

Colocando a crença de lado, que é assim que gosto de conversar, a Igreja produziu um argumento fantástico.
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A ideia duma trindade sem, contudo, cair no politeísmo. A ideia de três em um e um em três. Como o shampoo.
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Só muito recentemente avaliei solução para este embroglio. Um mistério que a igreja chama de mistério da fé.
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Então, a trindade é uma representação humana da divindade. O homem é simultaneamente corpo (Jesus), código genético (espírito santo) e espírito (deus). Três em um. Três dimensões numa só entidade como a trindade. Eu sou corpo que me dá forma, tenho uma singularidade que distingue dos demais (código genético) e sou animado por uma energia (espírito). Como a trindade: Jesus, Espírito Santo e Deus.
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Rb

Ricciardi disse...

Insistindo em colocar a crença de lado, vejo a Trindade como uma excelente forma de representação da divindade. Perceptível deste modo e sem mistério algum.
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Quando agora outros argumentam que o conceito de trindade é uma heresia politeísta, defendo-a deste modo. Três faces da mesma pirâmide.
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Quanto à parte que Cristo humanizou a divindade não me parece exclusivo do catolicismo. Tempos houve em que deuses coabitaram com, e até fecundaram mulheres. Os deuses gregos tinham filhos com muitas humanas.
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Rb

Anónimo disse...

Penso que o Espírito Santo é o elemento que une permanentemente Pai e Filho.

Por essa razão não se cai no politeísmo.

Curiosamente penso que o ES tem mais importância do que aquela que normalmente lhe atribuímos.

Arrisco-me a intuir que Ele (Espírito Santo) é o "responsável operacional" pelos sinais que o Prof. PA recebe e interpreta correctamente como sendo enviados por Deus.

"Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito." João 14,26

A.

zazie disse...

O Espírito Santo e a Trindade é das questões teoricamente mais avançadas que existiu.

Curiosamente foi a partir dessa querela em torno da natureza de Deus e de Cristo que houve cisões e o Cristianismo se foi espalhando em seitas consideradas heréticas. O PA tem razão- os prot ainda derivam dessa querela e atribuem um sentido uno e divino a Cristo.

Os debates que existiram foram filosofia especulativa e teoria da linguagem muito antes dela ter sido inventada.

O que serve também para se perceber que é falso dizer que o Cristianismo foi imposto por ser religião de Estado com Constantino. Espalhou-se de forma teórica, racional, emotiva e sensível.

Por todos estes meios e só assim se entende a sua superioridade e o modo como facilmente foi incorporado nos grandes tratados filosóficos medievais.

zazie disse...

O Espírito Santo tem uma gigantesca importância.

Estranhamente foram as heresias dos cultos dos Impérios que ficaram pelas ilhas e transitaram para o Brasil que o mantiveram.

Acho que não tem tanta importância na doutrinação porque é uma questão teoricamente muitíssimo elaborada.

É fácil de atingir a noção de Deus e a de Cristo; não é assim tão fácil entender esse pneuma divino -essas língua de fogo e esse baptismo. Porque a sua história também é universal e faz a ponte com a da Filosofia.

marina disse...

se fosse um homem como outro qualquer não faria milagres. muito provavelmente , dado desafiar as leis da natureza , não sentia qualquer tipo de desejo sexual .
um bocadinho de lógica parece que faz falta na religiosos do oitenta , parece pois.

Zephyrus disse...

O Professor está a puxar velhas questões teológicas que já existem há quase dois mil anos.

Há uns anos passou-me pela cabeça ser Luterano. Desisti no próprio dia quando percebi que recusavam o culto à Virgem. Pensei: então se no Universo existe o Masculino e o Feminino, fará algum sentido recusar o culto à Mulher? Então se a Igreja Católica faz culto a Cristo, que foi homem, e à Virgem, que foi mulher, parece-me então que o Protestantismo, ao rejeitar o Feminino, é um judaísmo que não rejeita Cristo. Para mim não serve.

Zephyrus disse...

«O Espírito Santo tem uma gigantesca importância.»

Pois tem.

E é extraordinário que apenas se tenha conservado nos Açores e numa povoação nos arredores de Sintra. É um culto único em toda a Europa.

E nestas coisas que percebemos a singularidade do catolicismo português, distinto do espanhol.

Curiosamente, quando seguimos o catolicismo espanhol deu porcaria. Foi o que sucedeu com a instalação da Inquisição.

Anónimo disse...

A noção cristã da Trindade só se estabiliza aí uns 700 anos depois de Cristo. Basta ler com atenção as diferenças inesperadas em que Jesus não iguala o Espírito Santo a Si, nem ao Pai.
João 14,16: ”Se me tendes amor cumprireis os meus mandamentos e Eu apelarei ao Pai e Ele vos dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco, o Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber porque não o vê nem o conhece; vós é que o conheceis porque permanece junto de vós e está em vós”.
João 14,26: “Mas o Assistente, o Espírito Santo, que o Pai vai enviar em Meu nome, é que vos há de ensinar tudo e vos recordará o que Eu vos disse”.
João 15,26: “Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, que procede do Pai, e que Eu vos hei de enviar da parte do Pai, Ele dará testemunho a meu favor”.
João 16,13: “Quando Ele vier, o Espírito da Verdade, há de guiar vos para a Verdade completa. Ele não falará por si próprio mas há de dar vos a conhecer quanto ouvir e anunciar-vos o que há-de vir. Ele há de manifestar a minha glória porque receberá do que é meu e vo lo dará a conhecer. Tudo o que o Pai tem é meu; por isso é que Eu disse: «Receberá do que é meu e vo lo dará a conhecer»”.

Dá que pensar...

zazie disse...

Como assim?

Onde é que aprendeu esses disparates?

zazie disse...

aqui

zazie disse...

Dá que pensar porque a noção de Espírito Santo é um logos divino.

Entra-se na Filosofia e é transversal até ao judaísmo.

zazie disse...

Mas a Trindade é teorizada muito antes e aquando da querela entre monofositas e nestorianos.

zazie disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
zazie disse...

informação

Anónimo disse...

O Casino Estoril que provocou o maior despedimento colectivo e o maior fado deste drama é juizes serem pagos por offshores e com isto destruírem centenas de famílias tudo para o Sr. egoísta ter razão. substituir trabalhadores por capricho de um administrador que faz negocio com o próprio Casino é de suspeitar a ordem do despedimento colectivo.

Anónimo disse...

Olhe Zazie, não é só Vexa que pensa. Eu também e, seguramente, com alto nível.

A anónimo da Trindade.

Vexa tem muita sopa e muito chá para beber. Deixe-se de cacas quando não atinge o assunto.

zazie disse...

Ó Ferreira, vai-te lavar

zazie disse...

És tão paineileiro que até te disfarças de mulher

Anónimo disse...

não é só Vexa que pensa. Eu também e, seguramente, com alto nível.



Nas caixas de comentarios encontra-se cada adiantado mental... Vai la vai.

E este ainda por cima e dos que pensa...

zazie disse...

O velho é retardado mental e persegue-me por toda a parte

marina disse...

Meu Deus faz om que o Espírito Santo ilumine estas cabecinhas e consigam interiorizar a Lex Parsimoniae porque já não há quem os ature.