15 abril 2014

Ter filhos, a má ideia que prevalecerá

A cultura é um conjunto de respostas e ideias preconcebidas que resistiram ao desgaste do tempo. As ideias que dominam uma cultura não necessitam de ser as melhores do ponto de vista racional, mas sim aquelas que têm em si o génese da sua própria reprodução. Se alguma dúvida existisse sobre a aplicação do evolucionismo ao campo das ideias, uma ideia sobressai como o exemplo acabado de resposta irracional com grande sucesso reprodutivo: ter filhos.
Ter filhos é uma obsessão de virtualmente todas as culturas e subculturas modernas. Uma gravidez é uma benção e, um pouco por todas as culturas, existem deuses, santos e profetas dedicados à fertilidade. Mesmo as subculturas modernas mais revolucionárias, como a LGBT, valorizam a ideia de família, ao ponto de centrarem a atenção da sua luta no direito à criação de uma família.  Campos políticos opostos concordam nesse ponto fundamental: é bom ter filhos (a política chinesa do filho único também tem a sua explicação evolucionista, mas deixemos isso para outro post).
Racionalmente, ter filhos é uma péssima ideia. É-o para a mulher em primeiro lugar, cujas exigências da gravidez e do aleitamento são um fardo na sua vida profissional e pessoal e, para uns assustadores 15%, geram complicações de saúde potencialmente fatais. Muitas mulheres queixam-se de solidão nos primeiros meses após o parto (depressão pós-parto é um problema bastante frequente). Nas sociedades modernas muitas perdem a autonomia financeira quando decidem ter filhos, ficando a depender do marido. O marido, por sua vez, fica com a obrigação legal de tomar conta dos filhos, apesar do seu instinto natural após nascimento ser o de procurar outra fêmea para acasalar, deixando a cria ao cuidado da mãe. Durante anos, os pais tornam-se absolutos responsáveis pelo bem-estar dos filhos. Perdem a sua liberdade, alteram o seu estilo de vida e abdicam de bens materias que não teriam que abdicar se não tivessem filhos.
Dirão alguns que o retorno é elevado: os filhos trazem alegria a uma casa. Estudos provam o contrário: as fases mais felizes da vida de um casal acontecem precisamente antesde ter filhos e depois destes saírem de casa. A fase mais infeliz corresponde aos período a seguir a ter o primeiro filho e durante a adolescência. Mas a cultura defende-se muito bem deste tipo de racionalidades: qualquer pai ou mãe que se queixe que a sua vida piorou depois de ter filhos ou, Deus nos livre, afirme que se arrependeu de ter tido filhos, é severamente punido socialmente pela sua posição.

E a cultura reproduz-se, à conta de uma ideia irracional. Mesmo se uma transformação cultural levasse a que certa cultura optasse pela visão racionalista de que ter filhos é um fardo pelo qual não vale a pena passar, não seria a ideia a morrer, mas a cultura que a rejeitaria. Por definição, as culturas vencedoras do processo de evolução serão sempre aquelas que privilegiem a fertilidade, independentemente da irracionalidade dessa ideia. 

23 comentários:

jcd disse...

"A fase mais infeliz corresponde aos período a seguir a ter o primeiro filho."

Discordo desta frase. Absoluta e completamente.

Ljubljana disse...

Caro CGP,

Ao longo do seu texto, que basicamente fala da família, várias vezes refere o termo racional, na sua forma simples ou composta, a palavra amor, nunca lá aparece, nem uma única vez, a palavra Deus caiu lá por acidente, na expressão "Deus nos livre". Desculpe, mas o meu conceito de família, de sentir e de estar em família está nos antípodas do que você descreve aqui, ou vivemos em países diferentes e/ou épocas diferentes.

Carlos Guimarães Pinto disse...

Amor e Deus, os dois conceitos culturais mais importantes para justificar todo o tipo de irracionalidade que nos permite continuar a existir enquanto cultura.

zazie disse...

Que disparate.

Ter filhos é a maior alegria.

Uma mulher que disser o contrário só pode ser uma desnaturada.

Aliás, acerca do casamento não sei. Cada um é para o que nasce. Agora ter filhos é mil vezes mais importante que ter cara-metade.

zazie disse...

Nunca na vida colocaria cara-meta à frente de prole.

Por isso é que também não respeito aqueles galináceos que dizem que abortaram porque o namorado ou marido quiz.

São mariazinhas parvas.

zazie disse...

Vida de casal sem família é que me soa a tédio até dizer chega.

Acho que isso é que justifica todas e mais algumas escapadelas para desanuviar de todo aquele "amorzinho e cabana".

zazie disse...

Na verdade, até vou mais longe- sem filhos nunca entendi como duas pessoas se conseguem aturar.

ehehehe

Anónimo disse...

CARLOS, GET A PET!!!

Vivendi disse...

O CGP estrangeirou-se?

É nestas alturas que faz falta por aqui o PA.

Este blogue sem o comandante Arroja fica à deriva.

umquarentao disse...

BANDALHEIRA: pessoal que não se preocupa com a construção duma sociedade sustentável (média de 2.1 filhos por mulher)... critica a repressão dos Direitos das mulheres... todavia, em simultâneo, para cúmulo, defende que... se deve aproveitar a 'boa produção' demográfica proveniente de determinados países [nota: 'boa produção' essa... que foi proporcionada precisamente pela repressão dos Direitos das mulheres - ex: islâmicos]... para resolver o deficit demográfico na Europa!?!?!
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NOTA:
- Muitas mulheres heterossexuais não querem ter o trabalho de criar filhos... querem 'gozar' a vida.
- Muitos homens heterossexuais não querem ter o trabalho de criar filhos... querem 'gozar' a vida.
--->>> Conclusão: é ERRADO estar a dizer (como já alguém disse) «a Europa precisa de crianças, não de homossexuais!»... isto é, ou seja... a Europa precisa de pessoas (homossexuais e heterossexuais) com disponibilidade para criar crianças!!!
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Pelo Direito à Monoparentalidade em Sociedades Tradicionalmente Monogâmicas -> blog « http://tabusexo.blogspot.com/ ».
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Desfaçatez: Em vez de quererem impor proibições à monoparentalidade... deveriam, isso sim... era dirigir fortes críticas contra aqueles que dizem que a 'solução' do problema demográfico europeu está na naturalização da 'boa produção' demográfica daqueles (ex: islâmicos) que tratam as mulheres como uns 'úteros ambulantes'.
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Uma obs: Quando se fala em Direitos das crianças... há que ver o seguinte: muitas crianças (de boa saúde) hão-de querer ter a oportunidade de vir a ser pais... oportunidade essa que lhes é negada pela 'via normal'...


F.Rui.A.R.

Euro2cent disse...

> Na verdade, até vou mais longe- sem filhos nunca entendi como duas pessoas se conseguem aturar.

Bem metida. "Si non é vero, é bene trovato". ;-)


Anónimo disse...

Tipico self-centered anglo-sax: " Perdem a sua liberdade, alteram o seu estilo de vida e abdicam de bens materias que não teriam que abdicar se não tivessem filhos"

Ou nao tem filhos e nao faz ideia ou ja se tornou prot...

Elaites

Ricciardi disse...

Na verdade, o modo de vida do casal muda radicalmente depois do nascimento do filho.
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Deixa-se de poder fazer a vida que se fazia sem eles.
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Faz-se outra. Pessoalmente agrada-me mais esta segunda fase, embora tenha pontualmente saudades da anterior.
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A mulher muda. Claro. Mal era se não mudasse. Nessas alturas um gajo só tem é que trata-las melhor a ver se ultrapassam mais suavemente o estado de espirito pós parto.
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Eu não acredito na fiabilidade dos estudos que o CGD apontou.
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Parece-me que se trata de um erro tecnico estatistico. Com perguntas mal efectuadas.
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Por exemplo se me perguntar o que faziamos antes de ter filhos, eu responderia que saiamos e nos divertia-mos e viajavamos muito. Uma alegria.
Hoje saimos menos, viajamos menos. Os miúdos tem aulas, pessegadas disto e daquilo.
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Estatiticamente o CGD concluia que eu era mais feliz antes de ter filhos.
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Mas se perguntar ao casal se preferiam não ter os filhos que tem para poder ter a vida anterior, 99% das pessoas responderia que não. Que preferem ter os filhos que tem a ter a vida anterior.
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Portanto, a estatistica, se nao for bem feita, induz respostas falseadas.
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A estatistica é, aliás, a melhor forma de enganar as pessoas.
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Rb

Pedro Sá disse...

Ora, estão com interpretações rebuscadas para quê? Este artigo só prova que o CGP é um materialista radical, nada mais que isso.

Antonio disse...

Pena que os pais do CGP não tenham sido acometidos de uma racionalidade extrema!

zazie disse...

A questão é que eles dizem estas coisas e tiram estas ilações com um exemplo de gente bué de jovem a pensar na carreira.

Só que o tempo passa.

Isso de sair menos e divertir menos vai sempre acabar por acontecer.
Portanto, ficarem dois pascácios a olharem um para outro sem mais ninguém é o horizonte da felicidade prot estéril.

Podia ser pior, é um facto- podiam ficar sem filhos e sem cara-metade.

É essa a sorte de quem acredita na patranha hedonista à la Rand

zazie disse...

O proble3ma é quando as pessoas tendem a fazer projecção para os outros das suas pequenas faltas que os atormentam.

Por instinto, quem é saudável, quer ter filhos.

Só não qur quem é avariado.

Pedro S. disse...

Carlos, permite que rebata o teu post ponto por ponto. Argumentarei com base em dados cientificos e argumentos racionais, mas reconhecendo que no fim de contas, e’ uma decisao pessoal que esta em causa, e que o mais relevante e’ a apreciacao subjectiva de cada argumento. O que e’ uma boa ideia para uns e’ uma pessima ideia para outros, porque na verdade somos todos diferentes e nao estamos obrigados a gostar todos do mesmo. Para dar um exemplo, ha quem adore fazer desporto (ex. faz bem a saude, liberta serotonina, torna-nos mais atraentes, e’ divertido) – e quem prefira nao ter que o fazer (ex. risco de lesoes, cansa, e’ entediante, e’ caro, ha coisas mais divertidas para fazer, etc.).

Apenas nao rebato o argumento que as ideias que sobrevivem sao as que tem em si a genese da sua propria reproducao porque basicamente concordo com ela. A conclusao tambem esta certa, a cultura que nao defenda ter filhos sera ultrapassada por uma que defenda ter filhos.

Pedro S. disse...

Quanto a ter filhos, racionalmente e’ uma excelente ideia. Primeiro para a mulher, cuja gravidez e aleitamente promove uma renovacao do corpo, reduzindo significativamente a probabilidade de certos tipos de cancro, permite uma pausa justificada, e muitas vezes remunerada, na vida profissional da qual a maior parte das pessoas nao retira real satisfacao, e permite receber atencao e carinho especial de toda a gente, o que tende a ser muito apreciado pelas gravidas!

Muitas mulheres sentem menos solidao apos terem os filhos (depressao pos-parte e’ um problema facilmente corrigivel apos identificado). Alias, os filhos sao uma excelente forma de conhecer novas pessoas e reforcar velhos lacos de amizade.

Nas sociedades modernas, perder a autonomia financeira para o marido e’ uma escolha livre e precede ter filhos (da-se na altura do casamento, regra geral e’ co-dependencia, e nao e’ vista como uma desvantagem, pelo contrario e’ visto como uma solucao “mutualista” de reducao de risco pessoal). Alias, so deixa de trabalhar quem quer.

Nas sociedades modernas e’ hoje bem aceite a paternidade activa, o que e’ fonte de grande satisfacao para muitos pais, que teem grande prazer em cuidar e educar os seus filhos, e os direitos legais dos pais comecao a ser reconhecidos (note-se a quantidade crescente de pais que luta pela guarda das criancas em caso de divorcio).

Nao e’ verdade que os maridos tenham um instinto natural de procurar outra femea para acasalar (e nesse caso, nao deviam ter casado, quanto mais ter filhos). Na verdade, na maioria dos casos o seu nivel de testosterona desce, o que indicia maior propensao para ficar por casa, nao o contrario. Note-se que ambas as situcoes sucedem – uns homens com maior propensao para sair (se calhar o teu caso?), outros para ficar.

Os pais tornam-se absolutos responsaveis pelo bem-estar dos filhos, o que lhes da um aumento de auto-estima significativo. A perda de liberdade e’ limitada, pelo contrario passam a ter companhia garantida para as suas actividades favoritas (nao sei uma actividade que eu goste de fazer que nao possa fazer com filhos – certo, nao posso ir a discoteca, mas tb nunca gostei...). Por outro lado, convem pensar no longo prazo. A partir dos 70, a eventual perda de “liberdade, estilo de vida e bens materiais” muitas vezes e’ recuperada com juros. Os filhos tornam-se fonte insubstituivel de companhia (sobretudo numa idade em que e’ dificil fazer novos amigos, sobretudo mais novos), permitem prolongar a independencia pessoal (ter de abandonar a propria casa e ir para um lar, pelo menos antes do necessario) e sao fonte de seguranca material para os mais idosos.

Os estudos que refere tem uma logica hedonista e ignoram a atmosfera de crescimento pessoal que ter filhos proporciona, o que para muitos e’ mais importante que a “felicidade” imediata tal como e’ analizada pelos estudos (e tenho varios teoricos da “felicidade” que confirmam a minha visao das coisas). Mas isto e’ uma questao de preferencia pessoal, ha pessoas mais hedonistas (o Carlos representado neste post), e outros mais motivados por crescimento pessoal e por “meaningfulness” (o Carlos que se da ao trabalho de boglar a varios anos sem qq beneficio pessoal imediato...). Claro, para quem nao quer / nao gosta de ter filhos, nao ha crescimento pessoal possivel... Ha tambem espaco para interpretacao – o Carlos ve felicidade no momento em que os filhos saem de casa, eu vejo felicidade no momento em que os pais veem a sua tarefa concluida com sucesso! Isto e’ corroborado pelos estudos 1 e 2: os mais felizes de todos sao os que tiveram filhos, depois destes sairem de casa, nao os que nao tiveram filhos de todo.

Em conclusao, ter filhos e’ uma boa ideia? Nao necessariamente. E’ boa para quem quer ter filhos. Nao ter filhos e’ uma boa ideia para quem nao quer ter filhos. O que achas, Carlos?

Pedro Sá disse...

Obviamente que o desenvolvimento pessoal não se pode esgotar dessa forma na paternidade/maternidade, isso é de um limitacionismo pouco inteligente.

Ricciardi disse...

Ter filhos nunca foi uma cena racional. Ninguém pensa na racionalidade quando faz amor com a mulher.
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É coisa institiva. Tão natural como a sede.
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A sociedade actual, da forma como está economicamente organizada, é que restringiu esta propensão natural criando um mar de dificuldades aos casais.
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Rb

Pedro S. disse...

E nao se esgota, mas esta la e nao deve ser ignorado. E isto aplica-se a outras areas. Eu nao gosto de ir ao ginasio, mas fico contente por ver os musculos maiores. Alias, é curioso que o estudo que o CGP mostra avalia a felicidade CONJUGAL, a qual nao captura o que é relevante. O relevante é a satisfacao com a vida, ou no minimo com a vida familiar. Se eu arranjar um trabalho mais interessante e que pague mais mas tenha de trabalhar mais horas, isso pode piorar a minha relacao conjugal, mas ambos ficarmos mais satisfeitos com a vida que temos. O Carlos acha irracional!

Anónimo disse...

Nesse caso, dormir nao é racional, comer nao é racional, vendo bem, nao sei bem se ha algo racional... Irracional é nenhum dos dois querer sexo e fazerem-no à mesma. Ou os tipos que como o Carlos nao querem ter filhos, mas depois fazem-nos so pq sim...