10 novembro 2013

a cunha

Eu gostaria agora de voltar ao meu post anterior para explorar alguns temas económicos relacionados com esta diferença entre católicos e protestantes para chegar à Verdade (Deus). Os protestantes procuram chegar à Verdade de forma directa. Os católicos procuram chegar lá de forma indirecta, por interposta pessoa.

Evidentemente que a primeira instituição que daqui resulta para a economia do catolicismo é a cunha - uma instituição que é vista no mundo protestante como batota, jogo sujo, senão mesmo, e literalmente, como corrupção.

É preciso, porém, distinguir. Se eu possuir uma empresa familiar e decidir empregar o filho de um amigo, que me meteu uma cunha, em lugar de qualquer outra pessoa que possa existir no mercado,  ainda que melhor, eu não estou a prejudicar ninguém, excepto eventualmente a mim próprio. É uma prova ou uma retribuição de amizade (amor ao próximo em sentido lato, um dos valores mais altos do catolicismo, e que o protestantismo deprecia), e não se trata de qualquer batota, jogo sujo, menos ainda de corrupção. E, dentro de condições aproximadas,  é perfeitamente racional que o faça porque, se hoje é o meu amigo a precisar de mim, amanhã poderei ser eu a precisar dele, ao passo que empregando um estranho, eu não posso esperar nada dele a este respeito.

Se o fizer como gestor de uma sociedade anónima, ou director de um serviço público com autonomia financeira e de recrutamento de pessoal, aí o caso já é diferente. Aí os accionistas, num caso, os cidadãos-contribuintes no outro, saem lesados por eu contratar o filho do meu amigo, em lugar do melhor candidato ao lugar, supondo condições idênticas de salário.

O ponto é que as sociedades anónimas não são a forma empresarial da nossa tradição - são uma forma empresarial da tradição protestante e constituem, por isso, excepções entre nós. A forma empresarial da nossa tradição é a empresa familiar (mais de 95% das empresas portuguesas são familiares ou de amigos). Nem um Estado que concede autonomia aos seus serviços pertence à nossa tradição - o estado descentralizado é uma tradição protestante. A nossa tradição é a de um Estado altamente centralizado.

Agora, se nós descentralizarmos o nosso Estado, dando autonomia a certos serviços, aos fundos autónomos, às empresas públicas, às Câmaras Municipais, etc.,  não nos poderemos depois queixar que a breve trecho elas estejam pejadas de amigos, de filhos dos amigos, e de correligionários - e depois digamos que há muita corrupção no país. Mas o problema não está em os portugueses serem inerentemente corruptos, está em que estão a viver com instituições que não pertencem à sua tradição - neste caso a descentralização administrativa e financeira.

O português, que seja um português verdadeiro, mete cunhas. Esta é a realidade. Ele já anda a meter cunhas a Deus há mais de dois mil anos, muito antes da nacionalidade, por que é que não as haveria de meter a um simples amigo?

3 comentários:

Pedro Sá disse...

Não vá aprender História de Portugal, na parte da História das Instituições, que não é preciso...essa visão não resiste a umas horas de estudo.

zazie disse...

http://1.bp.blogspot.com/-TdPCbtSCL3U/Un9oWBzMunI/AAAAAAAATqE/4ugblwMFnQ4/s1600/VPV+Inquérito.jpg

Carlos Velasco disse...

Há poucos dias li um artigo a respeito da queda da proporção de empresas familiares no total de empresas nos EUA, que agora mete em causa a evolução material daquela nação. Bom, mesmo assim as empresas familiares ainda constituem a maioria esmagadora das empresas americanas. Isso é só um pequeno exemplo que demonstra o quanto este texto, como todos os do seu autor, são baseados em fantasias ao invés de factos. A parte relativa à nossa tradição centralista está ao nível do "a Igreja pregava que a terra era quadrada antes de Colombo".
Enfim, cada parágrafo dava para uns cinco volumes de refutações, mas tive que me contentar com um post:

http://www.libertoprometheo.blogspot.pt/2013/11/as-direitices-da-direitinha.html

Saudações,

Carlos Velasco