17 março 2009

Dourar a pílula


Na sequência de um desafio que o Joaquim me colocou durante o fim de semana, gostava de dar a minha sucinta opinião acerca dos lucros recorde que a EDP apresentou há uns dias.

Primeiro, vê-se logo que é uma empresa monopolista. Um "monopólio natural" que algumas cabecinhas pensadoras cá do nosso burgo ainda entendem como perfeitamente aceitável, mas que na prática são limitadoras da concorrência e, por conseguinte, dos direitos dos consumidores (isto é, nos países onde, ao contrário de Portugal, os cambões são devidamente sancionados). Segundo, estes lucros decorrem em parte da titularização do défice tarifário, garantido pelo Estado e vendido pela EDP aos bancos. É, precisamente, sobre este último ponto que gostaria de me debruçar.

Na minha opinião, a titularização de receitas futuras - e seu registo no balanço actual - não devia ser permitida. Ao permitir este tipo de práticas, as regras de contabilidade tornam-se instrumentos geradores de riqueza quando, na verdade (!?), a contabilidade deve ser um mero espelho, absolutamente fidedigno da riqueza existente em cada momento - nas empresas, nas famílias e também no Estado. Infelizmente, em todos os sectores, existem milhares de operações deste género e que distorcem a respectiva realidade económica. É aquilo a que, em bom português, se chama de "dourar a pílula". Ora, a contabilidade não devia servir para isto!

No caso da EDP, a situação está particularmente viciada. Como não há concorrência, um compromisso político que suponho ser para manter, o défice tarifário resulta daquilo que a EDP, do seu pedestal, diz custar cada kilowatt de electricidade e o preço que o Estado define politicamente. Deste modo, existe um incentivo enorme para que a administração da EDP empole o preço da electricidade e o titularize com a garantia do Estado, porque sabe que, dificilmente, algum banco rejeitará ficar com o activo final. Quanto aos lucros da EDP, estes ficam insuflados e, em teoria, imunes a qualquer conjuntura económica, excepto se o Estado português for à falência e não honrar os seus compromissos. Para a administração da empresa, é uma "win-win"! Para os consumidores (e contribuintes), nem por isso.

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