02 março 2016

Confissão

Tudo visto, a resposta que mais me satisfaz a esta questão é a seguinte: "Não querem ser julgados".

Os partidos políticos são uma tradição protestante. Nesta tradição, Cristo veio ao mundo, em primeiro lugar,  para fazer Justiça. A tradição católica mantém que Cristo veio ao mundo, em primeiro lugar, para dizer a Verdade (e, de resto - questiona -, como é possível fazer Justiça sem antes conhecer Verdade?).

De qualquer forma, o julgamento dos comportamentos humanos põe-se nas duas tradições, a católica e a protestante. Na religião cristã, como em praticamente todas as religiões, Deus é visto como um Pai. O juiz é, portanto, a figura do Pai, cujo atributo principal como juiz, para além da independência, é o de que é um juiz benevolente, como é todo o pai.

A religião cristã, ao contrário do que dela mais tarde fez o protestantismo, não é dada a abstracções. Deus não é uma realidade abstracta que está nos céus. No cristianismo Deus é uma pessoa concreta - Cristo ("Eu e o Pai somos um só").

Portanto, o Juiz do Cristianismo é Cristo. E é a figura deste Juiz que os militantes partidários não gostam de ter por perto. Compreende-se porquê sem necessidade de elaborar.

A tradição católica, a partir de Cristo e dos seus apóstolos, criou e desenvolveu a figura do padre, que é também a figura do pai. Na tradição católica, o juiz dos nossos comportamentos e acções é o padre e o sacramento da Confissão católico é o acto do julgamento.

Porém, a tradição protestante, que rejeitou a figura do padre (e o sacramento da confissão), levantou uma questão: quem julga os meus comportamentos e acções?

Penso que foram dadas várias respostas a esta questão, mas a principal é: "a minha consciência". Portanto, eu ajo correctamente se agir de acordo com "a minha consciência".  Ora, "a minha consciência" não é um juiz credível. É um juiz parcial porque, na realidade, eu estou a julgar-me  a mim próprio.

Ao afastarem da vida política Cristo (e os padres, que são imitações de Cristo), os partidos políticos e os seus militantes não querem é ser julgados. O critério usado por Cristo é sempre o mesmo - o do bem-comum.

Será porque as decisões dos partidos nunca servem o bem comum?

Penso que sim. Um partido, como a própria palavra diz, é um grupo sectário e, e sendo assim serve é os interesses da seita, jamais aqueles que são comuns a todos.

Um militante partidário, que seja verdadeiramente um militante partidário, não presta contas a ninguém senão a si próprio ou "à sua consciência". Ele é um pequeno deus porque só Deus não presta contas a ninguém, senão a si próprio.

20 comentários:

Ricciardi disse...

O que se pretende, repito, não é tirar Cristo, nem Deus, das decisoes politicas. É, isso sim, tirar as religiões e os seus dogmas da decisão sobre o bem comum. Como não pode deixar de ser.
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De resto Cristo agradecerá se não o usarem para disputas políticas. A Deus o que é de Deus, a Cesar o que é de César.
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As religiões podem querer muito impor dogmas à comunidade, e fazem-no em várias sociedades mais atrasadas. Umas religioes proíbem o preservativo, outras a carne de porco, outras a de vaca, umas exigem burka, outras consideram o divórcio inadmissivel... o sexo para umas não tem apenas função reprodutora, para outras é pecado se não for para reprodução.
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Nao dá. As crenças devem ficar fora. Bem fora e simultaneamente no coração de cada um.
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Rb

Rui Alves disse...

Ricciardi
Tiremos a religião das discussões em sociedade, e ficam as ideologias. Que não têm menos dogmas. Só os dogmas das ideologias é que são válidos para discussão?

Harry Lime disse...

De qualquer forma, o julgamento dos comportamentos humanos põe-se nas duas tradições, a católica e a protestante. Na religião cristã, como em praticamente todas as religiões, Deus é visto como um Pai

Tenho seriissimas dúvidas acerca disto...

Quer dizer, o Budismo não funciona assim. Mas pronto, é uma religião que só é praticada por cerca de metade da humanidade... coisa pouca aos olhos do PA.

Rui Silva

Harry Lime disse...

De resto Cristo agradecerá se não o usarem para disputas políticas. A Deus o que é de Deus, a Cesar o que é de César.

Não posso concordar mais com o Rb.

A grande inovação do cristianismo foi precisamente admitir que a politica devia estar fora dos tramites da religião. Ou que a religião deveria estar fora da politica, se quiserem.

Mesmo nas sociedades relativamente laicas de Roma e da Grecia antiga, a cidade era identificadas com o seu Deus. Socrates foi condenado entre outras com o crime de "não reconhecer os Deuses que a Cidade reconhecia" (fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Trial_of_Socrates#Ancient_interpretations )

Da mesma forma, na Roma Antiga, os imperadores eram considerados seres de natureza divina (apesar de estarem sujeitos aos todos os vicios demasiado humanos). Julio Cesar considerava ter direito a fazer sexo com qualquer mulher que desejasse porque, defendia, tinha necessidade de propagar a sua semente o mais possivel. (este Julio Cesar sabia fazer as cenas :-) :-)

Ora, Jesus Cristo (também ele condenado por "não reconhecer os Deuses que a Cidade reconhecia" ) rompeu com a pratica corrente que transformava em teocracia qualquer regime politico (em que "governante" é igual Deus, regulado por leis divinas)

No campo poltico, ele defende que a poltica é humana e deve ser praticada tendo em conta o caracter humano dos seus interveneientes e das sua sinstituições. Como tal não pode regular as relações com o divino. Mas tambem defende o contrário: o divino não consegue regular o "negócio das cidades" ("politica").



Curiosamente, esta forma de fazer as coisas não tornam as sociedades menos cristãs mas pelo contrário tornaou-as mais cristãs: porque mais humanas e mais compassivas... a marca definitiva da verdadeira cristandade.

Ora que eu vejo nos escritos "católicos" do PA, tal como nos dos talibans ou no dos evangelicos americanos, é precisamente a negação desta mensegem profundamente cristã.

(mais uma vez e curiosamente estas posições têm origem em "intelectuais", que tentam racionalizar e normalizar o divino á medida do home... precisamente o contrário do que Cristo defendia, é giro, não é?)

Rui Silva

PS. Eu não sou cristão mas a minha Mãe é. E não é "intelectual", Graças a Deus!

Anónimo disse...

Concordo com o Arroja: os homens enquanto pequenos deuses passaram a prestar contas só a si próprios. Não concordo é com a ideia de que isso seja uma consequência do afastamento de Jesus da vida em geral, pois um simples silogismo lógico mostra-nos que se "os homens foram criados à imagem e semelhança de Deus" e "Deus só presta contas a si mesmo" então "os homens são os criados que só prestam contas a si mesmos". Ou seja, os homens só prestarem contas a si próprios é afinal a realização e o cumprimento da doutrina cristã, até porque consiste em seguir o exemplo daquele que ficou conhecido como encarnação de Deus, e que rejeitou muitos dos preceitos morais que os "padres" judeus consideravam invioláveis e sagrados. Ao fim ao cabo, Jesus foi condenado à morte porque decidiu que não tinha de prestar contas aos sacerdotes e por se manter fiel à sua própria consciência.
Depois, convém também lembrar que foi Jesus quem disse, em oposição aos tais sacerdotes, "não julgueis e não sereis julgados", sendo assim quem começou por rejeitar os julgamentos em nome de Deus e da religião e feitos pelas supostas autoridades religiosas. Desta forma, pode-se dizer que os protestantes estão mais próximos que os católicos da "verdadeira" doutrina cristã, pois o protestantismo nasceu como rejeição do poder papal e de todos os intermediários entre os crentes e Deus. Mais: ao contrário do que diz o Arroja, é também no protestantismo que Deus é uma realidade intimamente ligada à vida concreta (e por isso mesmo Max Weber estabeleceu uma relação entre o surgimento do capitalismo e do protestantismo), e não no catolicismo que concebeu a sua teologia servindo-se da filosofia platónica, primeiro, e da aristotélica, depois, do que resultou um Deus dos filósofos (ou abstracto) cristianizado, rejeitado por Lutero (para quem a Razão era uma prostituta) e mais tarde pelo filósofo protestante Kierkegaard. Para além disto, no catolicismo mais popular é que Deus é um ser que vive nos céus e sem qualquer ligação com a vida terrena, pois o seu papel é apenas o de nos julgar depois da morte. O julgamento cá em baixo era feito pelos padres, que a troco de poder e pagamentos perdoavam a vida imoral. Uma espécie de vendilhões do templo.

Josephvs disse...

Ao Anonimo das 7:33

Va pro caralho :P e leva o cao!

Anónimo disse...

Estou à espera da tola da Zazie.

Populaça

Euro2cent disse...

> Os partidos políticos são uma tradição protestante.

Camarada PA, isto de ter uma perspectiva tem limites. Não abandalhe demasiado a história, que depois quem tiver lido um ou dois livros começa a ter dificuldade em acreditar no resto que diz, que até é relevante.

Quer dizer, os aristocratas com dinheiro (optimates) e os aristocratas sem dinheiro (populares) de Roma andaram à pancada porquê? Tinham lido as teses do Lutero?

(Sem falar dos tiranos e democratas gregos, bla-bla wiskas saketas, mai-los babilónios e persas e egipcios e os outros todos perdidos nas brumas.)





zazie disse...

Um medievalista ao menos não começa a história por Roma; começa pelo Génesis

":OP

Euro2cent disse...

> Nao dá. As crenças devem ficar fora

Camarada, pare. Camarada, tenha dó. Não diga bojardas destas.

As crenças são a primeira coisa, são a expectiva comum que marca qualquer sociedade. A sua "sociedade avançada" onde vale tudo é uma mera maralha onde todos se agridem porque as expectativas são individuais e diferem entre cada dois individuos que interajem.

Olhe, só para lhe dar um exemplo do que citou: o divórcio. Haver divórcio é a diferença entre uma mulher ser uma matrona segura da sua posição como governante do clã, e ser uma vaca alugada para parir.

Tenha dó e ligue os miolos, em vez de papaguear "progressismo".

Euro2cent disse...

> começa pelo Génesis

Bem, a instrução de alguns de nós, falando em geral, claro, é limitada ;-)

Mas esteja à vontade, embora eu seja resistente ao conhecimento, não sou impermeável ....

(a propósito de ontem aqui, obrigado pelas boas palavras, e se quiser ver de onde vem o pop viral, olhe para um caso incomummente pouco discreto: https://www.google.com/search?q=ONGs+funded+by+Soros )

zazie disse...

ehehe

Isso é impressionante. É mesmo impressionante e nem começou com ele. Começou logo no pós-guerra com todas essas ONGs dos Direitos Humanos.

Eu sei que a coisa tem de ser brutalmente financiada e haver um gigantesco poder para conseguir até legislar na ONU e UE muito do que querem. E dominam media.

Agora o que digo é que se espalha dessa forma viral que nem sabe propriamente o que está a fazer. E isso acontece tanto mais facilmente quanto mais socializante está a sociedade e mais megafones têm os tais que a tv promove.

Depois, é claro que depende da abertura de esquerda que calha no poder. Porque não é tudo igual. Daí andarem com os mesmos pacotes a tentarem tudo de 4 em 4 anos.

E isso é cá e no resto da Europa.
Mas que isto é a revolução em que tudo o que era sólido se dissolve no ar, não haja dúvida. E a globalização dos media concretiza-a. São todos autores. É tudo o "agora" e vai de roldão porque o que importa é transformar o mundo; não é entendê-lo, como dizia o mesmo.

Vivendi disse...

CRÓNICA: Concordo com o Raposo: odeiem-me também!

http://www.sabado.pt/portugal/detalhe/cronica_concordo_com_o_raposo_odeiem_me_tambem.html

Vivendi disse...

Soros & patrocinam forte e feio as organizações do politicamente correcto.

zazie disse...

E existem mais dois pequenos nadas que fazem tudo.

A semântica e o humanismo.

Repare como tudo seria diferente se se falasse como se falava há uns 40 ou 50 anos atrás (ou até muito menos).

Dizia-se assim para o mesmo-«"queremos uma sociedade de gente útil que trabalhe e não dê grande despesa e os inúteis doentes e velhos devem ser despachados. Por iniciativa própria depois de deixados sem alternativa».

Isto não passava- era o nazismo.

Agora dizem com outra semântica e embrulhado em humanismo- «"são direitos", cada um é livre de "optar" e é para evitar todo o sofrimento atroz em que se insiste preservar por dogma religioso da vida não pertencer a cada um».

A coisa está feita- de nazi passa a humanismo progressista que só um reaccionário beato impede.

Cfe disse...

Zazie,

Muito bem dito.

Cumprimentos

CFe

Cfe disse...

Há uma confusão de conceitos que anda para aí que ninguém repara.

Uma coisa é a separação entre Igreja e Estado, advogada por Cristo.

Outra bem diferente é confundir sociedade com estado, ora bolas. Estado ( e só escrevo com maiúsculas por ser no início da frase) é uma estrutura administrativa, não a entidade concorrente de Deus cá na terra.

Reclamam (com fundamento ou não) da proibição do galheteiro, do sal em certos alimentos e não sei mais do que, suportados pelo que lhes dá na veneta e depois alijam parte das pessoas que utilizam outros argumentos , que no maior da vezes tem suporte histórico, cultural, moral, ético e científico (até)?

A palavra dada pelo Prof. Arroja é certeira: batota.

Pedro Sá disse...

Er...pata na poça quanto ao protestantismo...aí quem julga os comportamentos e acções é Deus directamente, não por interposição de terceiros-padres...

Anónimo disse...

Ó Josephvs, qual é o caminho mais curto para ir para o caralho? É o teu cu ou a tua boca?

Anónimo disse...

Pedro Arroja, já lho escrevi: voltou em força e com a segurança que só quem sabe haver Deus poderá ter.
Deus o abençoe e à sua Família.