16 setembro 2013

a maluquinha de Arroios

É claro que o paradigma da filosofia moderna, baseado num razão independente e, portanto, uma razão que pode produzir de tudo, incluindo as maiores irracionalidades, é o Nietzsche. Eu nunca compreendi como é que se pode tomar a sério um maluco e um esquizofrénico, e tenho-me frequentemente interrogado como seria o Nietzsche considerado se, em lugar de ter nascido em Rocken, Prússia,  Alemanha, tivesse nascido em Mirandela, Trás-os-Montes, Portugal, ou numa qualquer freguesia de Lisboa.

E tenho a resposta, porque em Portugal, sendo uma cultura católica ou universal,  há de tudo, e portanto também há-de haver um equivalente do Nietzsche. E como se trata de uma cultura feminina, há-de estar personificado numa figura de mulher. E está. É a figura da maluquinha de Arroios.

20 comentários:

zazie disse...

Só um analfabeto pode fazer luxo na ignorância.

Maluquinho de Arroios é v.

zazie disse...

O que é que v. leu ou estudou do Nietzsche na vidinha toda?

Nada. Papgueia sem saber.

A maluca da côncia diz o mesmo- outra pagaia analfabruta

A retardade mental até publicou um artigo no jornal a dizer que a culpa da juventude andar vestida de negro e a fazer merda no Bairro Alto era do Nietzsche.

Veja lá na companhia de quem está.

zazie disse...

Este post é o seu retrato.

Deixe-o o ficar que depois bota-se isto no Aeroporto

":OP

zazie disse...

E o Nietzsche que foi o maior crítico do racionalismo.

Isto mete dó.

É que nem sei como se travem a escrever tanta imbecilidade sem pensarem duas vezes.

O Nietzsche como paradigam do racionalismo.

Experimente dizer isso publicamente, numa cena que não seja retardada mental lá de confrarias da vinhaça, a ver o que lhe acontece.

zazie disse...

Isto é que é conversa de mulherzinha.

O sopeirame é que costuma dizer que Filosofia é coisa para malucos.

Francisco disse...

Nestes assuntos a Zazie tem razão.

Então o Nietzsche foi dos primeiros intelectuais saídos do pós-iluminismo a criticar veementemente a "razão independente" como lhe chama o PA, a desprezar o legado de Kant, e a chamar a atenção que essa treta toda presumidamente racional tem que ser vista em contexto com as raízes culturais de cada lugar, e agora o PA prega-lhe uma desfeita destas?

Que ele era maluquinho não restam dúvidas, mas às vezes a maluquice também produz genialidades :)

Hoplita disse...

Quando um texto começa com «É claro que…» percebe-se rapidamente que o nível do pensamento não ultrapassa o estereótipo…

Anónimo disse...

Ahahah... O Nietzsche a maluquinha de arroios?... É nada... o nosso Nietzsche é o PA... é ao que temos direito... é mais ou menos o equivalente à nossa Claudia Schiffer ser o Joaquim...
Alô Zazie!... Tudo maravilhoso? -- JRF

Vivendi disse...

Relendo Nietzsche

Olavo de Carvalho
O Globo, 15 de fevereiro de 2003



Do fenômeno que denomino paralaxe conceitual -- o deslocamento entre o eixo da concepção teórica e o da perspectiva existencial concreta do pensador --, os exemplos são tantos, nos últimos séculos, que não me parece exagerado ver nele o traço mais geral e permanente do pensamento moderno. As idéias tornam-se aí a racionalização ficcional com que um intelectual se esforça para camuflar, legitimar ou mesmo impor como lei universal sua inaptidão de se conhecer, de arcar com suas responsabilidades morais, de se posicionar como homem perante a vida.

Nas culturas européias ou mesmo nos EUA, esse impacto alienante é amortecido pela barreira residual da tradição cristã e clássica. Mas, num país como o Brasil, psicologicamente indefeso entre os muros de geléia de uma cultura verbosa e superficial, qualquer autor que faça algum barulho no mundo adquire as dimensões de uma potência demiúrgica, cultuada com temor reverencial. Suas mais gritantes fragilidades passam despercebidas, e qualquer tentativa de apontá-las é condenada como pretensão megalômana ou insolência blasfema.

Um caso particularmente desesperador é Friedrich Nietzsche, a quem tantos neste país veneram, talvez porque nele encontrem algo como um monumento à sua própria alienação.

Outro dia, conversando com uma amiga antropóloga, ela me lembrou que em certa época recente, na USP, ninguém no seu departamento era aceito como gente grande se não soubesse classificar na ponta da língua os fenômenos culturais em apolíneos e dionisíacos -- uma distinção nietzscheana a que o livro de Ruth Benedict, “Padrões de Cultura”, dera foros de critério científico.

Vamos ver quanto vale essa distinção?

Em “A Origem da Tragédia”, Apolo, deus da luz e da ordem cósmica, é o senhor das aparências, do universo visível. Dionísio, caos e turvação, é causa e origem, é a realidade tenebrosa e fecunda por baixo do véu apolíneo. Assim diz Nietzsche, mas no mundo real as coisas às vezes são assim, às vezes não. Às vezes, é a aparência caótica dos fenômenos que oculta uma ordem profunda, a qual escapa ao comum dos mortais mas se revela aos olhos claros daqueles que Schiller denominava “filhos de Júpiter”. De fato, o contraste Apolo-Dionísio expressa, no mito grego, a tensão dinâmica entre os polos do caos e da ordem, da aparência e da realidade, em contínua rotação e intercâmbio no quadro do mundo. A compreensão de todo simbolismo mitológico ou religioso depende de um certo senso das inversões. Um símbolo, por definição, não tem sentido unívoco, podendo sempre transfigurar-se em seu contrário, conforme a esfera de ser a que se aplique num contexto dado. Por isto e só por isto tem força evocativa e geradora, não cabendo aprisionar na moldura de um conceito fixo aquilo que é antes, na feliz expressão de Susanne K. Langer, uma “matriz de intelecções possíveis”. Ao identificar de maneira estática a ordem com superfície, o caos com profundidade, Nietzsche eliminou artificialmente a tensão, congelando os opostos em papéis imutáveis. Degradou o símbolo em estereótipo. Transmutou o ouro em chumbo.

O pior é que ele cai nessa justamente no momento em que está protestando contra o racionalismo e clamando pela volta dos mitos como força renovadora da civilização. Neutralizar as inversões tensionais, prendendo os pares de opostos na grade fixa de uma correspondência biunívoca, é o suprassumo do racionalismo esterilizante. No caso, totalmente involuntário. Nietzsche simplesmente não entendia o que estava fazendo.

Vivendi disse...

Abominando a dialética, preferindo à busca das sínteses a ostentação espalhafatosa das oposições estáticas, mas ao mesmo tempo querendo cavar efeitos de linguagem no vocabulário da simbólica tradicional, no qual nada pode opor-se definitivamente a nada porque tudo aí são aparências em incessante metamorfose, o que ele fez foi uma metafísica grosseiramente linear camuflada sob um manto de símbolos falsificados. E nestes o leitor então projeta as mais lindas sutilezas dialéticas que, é claro, não estão lá. Confunde o Apolo e o Dionísio do mito grego com os de Nietzsche, o símbolo com o estereótipo, e vê neste as profundidades daquele. Melhor para Nietzsche, pior para o leitor.

Mas a substancialização fetichista dos opostos é somente um dos vários cacoetes mentais que, no autor de “Zaratustra”, buscam suprir a falta de autêntica intuição filosófica. Pior é este: ele confunde a reiteração enfática de um acidente com a definição de uma essência, e então sai disparando deduções daí obtidas pela via de um conseqüencialismo furiosamente mecânico. Assim ele transforma os problemas mais banais em dilemas insolúveis que lhe parecem tragédias, sem perceber que uma tragédia fabricada na base do hiperbolismo verbal não é tragédia, é farsa.

Em “A Gaia Ciência”, após mostrar que em muito do que o homem faz está presente o instinto de sobrevivência, ele conclui que esse instinto é “a essência” (sic) do bicho homem, e então reduz todas as demais qualidades humanas a disfarces do instinto de sobrevivência. Mas esse instinto, sendo comum a todas as espécies animais, não pode ser essência de nenhuma delas em particular. Se o fosse, nas demais teria de ser mera propriedade ou acidente, o que resultaria em afirmar que só uma espécie sobrevive por instinto, as outras apenas por hábito, por acaso ou talvez por frescura. Não é preciso dizer que elas não concordam com essa tese de maneira alguma.

O melhor em Nietzche são as notas de psicologia pejorativa, que ele extrai da observação de si mesmo mas em seguida projeta, com autoconfiança adolescente, em Sócrates, em Jesus Cristo, na humanidade inteira. O ressentimento do doente contra as pessoas saudáveis é uma delas. Mas por que esse diagnóstico deveria aplicar-se antes a Sócrates, velho soldado robusto, do que ao próprio Nietzsche, paciente crônico que mal se levantava da cama?

Vivendi disse...

O Super-último-homem

Olavo de Carvalho
Zero Hora, 6 de fevereiro de 2005



Nietzsche dizia que no futuro só haveria dois tipos de seres humanos: O “Super-Homem” e o “último homem”. O primeiro era o herói cultural – do qual ele mesmo se imaginava o protótipo – que, reconhecendo a radical historicidade e portanto inocuidade dos valores, se colocava acima de todos eles e inventava livremente seus próprios valores, como o pequeno deus de um microcosmo autônomo, altivamente pisoteando a “verdade”, o “bem”, a “humanidade” ou o que quer que tivesse o desplante de atravessar o seu caminho de glórias autolátricas. O “último homem”, ao contrário, era o idiota multitudinário incapaz de um pensamento próprio, reduzido à obediência rotineira e ao “espírito de rebanho”.

O que o filósofo jamais chegou a suspeitar é que os dois tipos eram exatamente a mesma pessoa, que em poucas décadas a completa identidade do Super-Homem e do último homem se manifestaria da maneira mais patente, mostrando que a distinção entre eles não passara de uma ilusão de ótica.

Os gaúchos tiveram recentemente a oportunidade de observar, nas ruas de Porto Alegre, sob o título de “Fórum Social Mundial”, a pululação ruidosa de exemplares vivos do “Super-último-homem”, a síntese indissolúvel dos dois personagens nietzscheanos, que sem dúvida constitui, desde já, o tipo dominante nas sociedades avançadas do século XXI.

O Super-último-homem não admite nenhum valor ou lei acima de si, julga e condena sem pestanejar civilizações e religiões milenares e, “filosofando com um martelo”, como o próprio Nietzsche, sai por aí derrubando tudo. Por via das dúvidas, no entanto, olha em torno para ver se seus colegas de militância estão fazendo o mesmo, e sente um profundo reconforto ao ver que não está sozinho, que está em perfeita sintonia com o espírito do rebanho.

Sentir latejar no peito, ao mesmo tempo, a altivez soberana do herói solitário e a aconchegante proteção das organizações de massa – eis o privilégio inaudito que a sociedade atual confere a cada estudante enragé , a cada apóstolo da “paz”, a cada militante feminista, gay ou pró-terrorista deste mundo. Nenhum deles aceita nenhuma autoridade acima de si, nenhum é capaz de apreender uma só idéia que já não venha com a chancela da autoridade coletiva.

Mas, como toda síntese, o tipinho não se reduz a uma justaposição mecânica de seus elementos. No ato de fundi-los, supera-os. O Super-último-homem é mais arrogante que o Super-homem e mais subserviente do que o último homem. O Super-homem contentava-se com a independência individual, proclamada quixotescamente contra o restante da espécie humana: o novo tipo quer subjugar a espécie humana, remoldá-la à sua imagem e semelhança. O último homem limitava-se a seguir a moral e os bons costumes, sem imaginação para contestá-los ou força para infringi-los: o Super-último-homem, à voz de comando da multidão, está pronto para descer ainda mais baixo, para violar a própria consciência e abdicar do último resquício de dignidade, prostituindo-se e aviltando-se até o ponto de exibir-se masoquisticamente como vítima de perseguição no instante mesmo em que desfruta, como ninguém, do patrocínio milionário do establishment paternal.

Não sei como Nietzche reagiria à visão dessa criatura que, em parte, ele próprio gerou. Provavelmente, de vergonha, estouraria os miolos.

Vivendi disse...

Ateus e ateus

Olavo de Carvalho
Jornal do Brasil, 15 e março de 2007



Há dois tipos de ateus: os que não acreditam que Deus existe e os que acreditam piamente que Deus não existe. Os primeiros relutam em crer naquilo de que não têm experiência. Os segundos não admitem que possa existir algo acima da sua experiência. A diferença é a mesma que há entre o ceticismo e a presunção de onissapiência.

Acima da distinção de ateus e crentes existe a diferença, assinalada por Henri Bergson, entre as almas abertas e as almas fechadas. Vou explicá-la a meu modo. Como tudo o que sabemos é circunscrito e limitado, vivemos dentro de uma redoma de conhecimento incerto cercada de mistério por todos os lados. Isso não é uma situação provisória. É a própria estrutura da realidade, a lei básica da nossa existência. Mas o mistério não é uma pasta homogênea. Sem poder decifrá-lo, sabemos antecipadamente que ele se estende em duas direções opostas: de um lado, a suprema explicação, a origem primeira e razão última de todas as coisas; de outro, a escuridão abissal do sem-sentido, do não-ser, do absurdo. Há o mistério da luz e o mistério das trevas. Ambos nos são inacessíveis: a esfera de meia-luz em que vivemos bóia entre os dois oceanos da claridade absoluta e da absoluta escuridão.

O simbolismo imemorial dos estados "celestes" e "infernais" demarca a posição do ser humano no centro do enigma universal. Essa situação - a nossa situação - é de desconforto permanente. Ela exige de nós uma adaptação ativa, dificultosa e problemática. Daí as opções da alma: a abertura ao infinito, ao inesperado, ao heterogêneo, ou o fechamento auto-hipnótico na clausura do conhecido, negando o mais-além ou proclamando com fé dogmática a sua homogeneidade com o conhecido. A primeira dá origem às experiências espirituais das quais nasceram os mitos, a religião e a filosofia. A segunda leva à "proibição de perguntar", como a chamava Eric Voegelin: a repulsa à transcendência, a proclamação da onipotência dos métodos socialmente padronizados de conhecer e explicar.

A religião é uma expressão da abertura, mas não é a única. A simples admissão sincera de que pode existir algo para lá da experiência usual basta para manter a alma alerta e viva. É possível ser ateu e estar aberto ao espírito. Mas o ateu militante, doutrinário, intransigente, opta pela recusa peremptória do mistério, deleitando-se no ódio ao espírito, na ânsia de fechar a porta do desconhecido para melhor mandar no mundo conhecido.

Dostoiévsky e Nietzsche bem viram que, abolida a transcendência, só o que restava era a vontade de poder. Aquele que proíbe olhar para cima faz de si próprio o topo intransponível do universo. É uma ironia trágica que tantos adeptos nominais da liberdade busquem realizá-la através da militância anti-religiosa. As religiões podem ter-se tornado violentas e opressivas ocasionalmente, mas a anti-religião é totalitária e assassina de nascença. Não é uma coincidência que a Revolução Francesa tenha matado dez vezes mais gente em um ano do que a Inquisição Espanhola em quatro séculos. O genocídio é o estado natural da modernidade "iluminada".

Vivendi disse...

Fica a opinião sobre Nietzsche do maior filósofo vivo em língua portuguesa.

zazie disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
zazie disse...

Se eu vivesse entre aqueles "cristões" evangélicos, ainda tinha dito coisas piores.

zazie disse...

O Nietzsche nunca foi ateu. Bastava ler-se os Fragmentos Póstumos.

zazie disse...

Olha só- apareceu o caro Doutor Engenheiro Campónio.

Saudades!

zazie disse...


Se faço guerra ao cristianismo, de tal tenho direito unicamente porque nada vivi deste lado de desgosto ou tristeza – pelo contrário, os seres mais dignos de estima que conheço foram cristãos autênticos, e de todo não guardo rancor aos indivíduos por aquilo que é fatalidade milenar. Os meus próprios antepassados eram eclesiásticos protestantes: não tivesse eu recebido deles um sentido elevado e puro, não vejo de onde me viria o direito de fazer guerra ao cristianismo. Em ocorrência, a minha fórmula: o próprio anticristão é a lógica necessária na evolução de um verdadeiro cristão, em mim o cristianismo ultrapassa-se a si mesmo.”


(Nietzsche, Fragmentos póstumos)

Euro2cent disse...

> em mim o cristianismo ultrapassa-se a si mesmo.

Eu da última vez que tentei isso na estrada ia-me saindo mal.

Mais ainda, o chicote que tive estragou-se por falta de uso.

O PA tem razão, essa cultura por cá não medra.

zazie disse...

Por cá é mais merda. Nem chega a ser tempo de indigências por falta de poetas.