09 dezembro 2022

Um juiz do Supremo (161)

 (Continuação daqui)


161. Fuga de capitais


Lê-se, relê-se, volta-se a ler, pasma-se e não se acredita (cf. aqui).

A cena desenrola-se nos arredores de Bragança. O chefe do bando é enteado de uma das suspeitas e o seu irmão Manuel também faz parte do bando.

Uma amiga da madrasta, emigrante em França mas de férias em Bragança, é suspeita de transportar três sacos com dinheiro, cada um com 150 mil euros, em notas grandes do Banco Central Europeu.

O objectivo é levar o dinheiro para França, pondo-o a salvo da cobiça dos enteados da amiga.

Este dinheiro teria sido levantado pela madrasta da conta bancária do pai, que falecera nessa manhã.

É o caso clássico, e o mais boçal, da fuga de capitais, em que o capitalista, por si ou por interposta pessoa, faz sair o dinheiro do país pela fronteira terrestre, devidamente acondicionado em grandes sacos ou malas cheias de notas.

É noite, o corpo do pai, um conhecido empresário da cidade, ainda jaz quente, decorre o velório na Igreja. 

Os bandidos combinam jantar à vez para não perderem a suspeita de vista.  

Até que chega o momento decisivo. A suspeita abandona a Igreja e o velório e mete-se no carro, dirigindo-se para casa. 

Logo depois, dois bandidos seguem-na de perto, também de carro, ao mesmo tempo que alertam os outros membros do bando.

A suspeita faz uma paragem no caminho para tomar café e comprar tabaco.

Imediatamente um dos membros do bando entra no café para vigiar o que ela está a fazer.

A suspeita volta ao carro e retoma o caminho de casa.

Os bandidos, agora já em número de quatro, vão atrás dela.

Quando a suspeita pára à porta de casa, e se prepara para entrar na garagem, é impedida de sair do carro através de violência física, e sequestrada pelos bandidos.

Segue-se uma grande altercação que dura cerca de duas horas, a suspeita é ameaçada de morte com uma pistola, e também de violência sexual, se é para dar às palavras o seu significado mais literal. "Eu fodo-te", diz o chefe do bando à suspeita.

Perante os protestos da suspeita de que aquilo é ilegal e mesmo crime, o chefe do bando, sabendo que ela fala francês, diz que é o Luís XIV e grita-lhe aos ouvidos: "A LEI SOU EU!",

E, de facto, tem alguma razão, porque são os próprios bandidos, na pessoa do chefe, que chamam a polícia, e a polícia vem solícita a seu pedido. O chefe do bando tem mesmo o número do telefone privado do comandante da polícia.

A polícia revista a suspeita, o carro, a casa e não encontra dinheiro nenhum.

Que pena, a história estava a ser tão interessante. Um caso gorado de fuga de capitais à antiga portuguesa.

É apreendido um revólver pertencente ao chefe do bando.

A suspeita vai dali, de ambulância, em estado de choque, para o hospital da cidade.

E o chefe dos bandidos vai dali, cinco anos depois, para juiz do Supremo.


(Continua acolá)

Sem comentários: