26 setembro 2018

aleatoriamente

Desde cedo me dei conta de que aquilo que os acusadores andavam à caça durante o julgamento - mais ostensivamente a Cuatrecasas do que o Ministério Público - era de crimes financeiros, não de crimes de ofensas, porque esses, eles sabiam que não existiam, e, de qualquer forma, não tinham importância nenhuma.

Qualquer informação ou facto mencionado em tribunal, ainda que resultante de mera insinuação ou mentira, poderia levar o juiz a extrair aquilo que, no jargão técnico, se chama uma "certidão", abrindo um novo processo-crime contra mim, desta vez de natureza financeira. A notícia de que o presidente da Associação Joãozinho estaria sob investigação por crimes financeiros, essa é que faria as manchetes dos jornais e seria a morte da Associação Joãozinho e da obra do Joãozinho.

Logo a partir da segunda sessão, pelos depoimentos que iam desfilando em tribunal, tive o sentimento de que a Cuatrecasas - que tinha cinco advogados entre as testemunhas -  me andava a devassar a vida.

A devassa era de natureza financeira e patrimonial e envolvia três esferas - a esfera pessoal, a esfera empresarial e a esfera da Associação Joãozinho. Disso fui dando conta neste blogue.

Este sentimento foi obtendo confirmação por outros sinais à medida que o julgamento se prolongava, e atingiu o auge com o depoimento do Dr. José de Freitas, sócio fundador da Cuatrecasas no Porto. Devido ao estado em que se encontrava, tudo aquilo que o Dr. José de Freitas dizia tanto podia ser tomado a sério como devido ao estado em que se encontrava. Ele acabaria mesmo por ser, aos meus olhos, e a grande distância de todas as outras, a testemunha mais divertida do julgamento. Devido ao estado em que se encontrava.

Até que chegou o dia em que o sentimento se transformou em certeza. Foi o dia em que escrevi o post com o título sugestivo de "um arruaceiro limpo" (cf. aqui), cuja mensagem era clara: "Andaram à caça dos gambuzinos e regressaram a casa como mereciam - de mãos vazias".

E que dia foi esse?

Foi o dia em que tive acesso ao texto escrito da sentença e conheci o nome do juiz.

Oficialmente, os juízes são escolhidos de forma aleatória para os julgamentos. E eu acreditei nisso durante todo o julgamento, em que não quis saber o nome do juiz,  tanto mais que se tratava  de crimes de ofensas que são crimes de lana-caprina.

Mas, com a sentença na mão, tinha chegado o dia de saber quem a assinava.

O juiz tinha um nome bem português que inicialmente não me suscitou qualquer reacção. Além disso, os juízes são, por norma, pessoas discretas, e fazem muito bem em sê-lo. Excepcionalmente, quando julgam algum caso mais mediático, o seu nome torna-se público.

Foi sem grande esperança de saber alguma coisa mais sobre o juiz que fiz uma pesquisa no Google.

Fiquei de olhos abertos, colados ao computador.

O juiz que foi escolhido (aleatoriamente) para julgar o meu caso - um caso de crimes de fim-de-semana, como lhes chama o Professor Costa Andrade - era um juiz especializado em criminalidade financeira. Foi o juiz que julgou o caso BPN no Tribunal de Santarém, que é um tribunal especializado em crimes financeiros (cf. aqui e aqui).

Um juiz como este é um recurso raro no país, não devem existir muitos como ele. Pois eu tive a sorte de me sair este juiz especializado em crimes financeiros para me julgar por crimes de ofensas verbais ao Paulo Rangel e à Cuatrecasas. Seleccionado aleatoriamente, que é como são seleccionados os juízes em Portugal.

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