28 novembro 2014

Estado de Pessoas

Num post anterior, o Joaquim chega à conclusão de que Portugal não é um Estado de Direito. Claro que não é. Já tentou várias vezes desde 1820 - a experiência iniciada em 1974 é apenas a última, mas não a única - e falhou sempre.

E por que é que falhou?

Porque o Estado de Direito não é um Estado da nossa tradição. É da tradição protestante.

O Estado próprio da nossa tradição é o Estado de Pessoas, não o Estado de Direito.

E o que é o Estado de Pessoas?

É o Estado que põe as pessoas acima das leis - ao contrário do Estado de Direito que põe as leis acima das pessoas -, o Estado que  considera muito acertadamente que as pessoas são mais importantes do que as leis, que as leis são feitas para servir as pessoas, e não as pessoas feitas para servir a leis.

O Estado de Pessoas põe no cume da governação, não a Lei - como o Estado de Direito -, mas uma Pessoa, que ela própria está acima da Lei.

E, idealmente, que pessoa é esta?

É a pessoa que melhor interpreta a Tradição das pessoas que constituem o seu povo, a sua comunidade. Onde está a lei positiva, feita por homens juristas, que caracteriza o Estado de Direito, o Estado de Pessoas põe outra "lei" - a tradição.

E qual a diferença entre a lei positiva e a tradição?

A lei positiva é uma lei para o aqui e o agora, normalmente criada para responder a um mal que afecta a sociedade. Pelo contrário, a tradição é uma norma que já vem de trás, que é boa para nós porque foi boa para todos aqueles que nos antecederam. Uma é baseada em pura construção intelectual, a outra é consagrada pela experiência, às vezes de muitos séculos. Uma procura resolver um mal, a outra procura perpetuar um bem.

O Homem que preside a um Estado de Pessoas tem então por tarefa principal interpretar a Tradição da comunidade e ajustá-la ao tempo presente. É uma tarefa extraordinariamente difícil exigindo um Homem de qualidade superior. Pelo contrário, o homem que preside a um Estado de Direito tem apenas de fazer cumprir a Lei, uma tarefa comparativamente muito mais fácil, e que qualquer homem vulgar pode desempenhar.

A ideia de que um Homem que preside a um Estado de Pessoas possui um poder arbitrário é a mais errada de todas as ideias. Ele está vinculado à Tradição, e não pode sair dela. Não há nenhum Homem na comunidade tão pouco livre como ele. É como se estivesse encarcerado numa prisão com barras de ferro. Mas ele faz isto e aceita este sacrifício para que todos os outros na comunidade sejam livres.  Ele é o guardador da liberdade que é uma tradição da comunidade e não pode nunca afastar-se do seu posto e descuidar a sua vigia.

Pelo contrário, um homem que preside a um Estado de Direito tem tanta liberdade como os outros. Mas precisamente porque tem tanta liberdade como os outros, é que os outros não podem ser livres. A liberdade dos outros é igual e está limitada pela liberdade que é reconhecida a esse homem, que representa todas as leis - às vezes até se lhe chama o Supremo Magistrado da Nação. Ora, não se dá a mesma liberdade a um rapaz de 18 anos e ao seu pai de 50.

No Estado de Pessoas, o governante supremo representa Pessoas, não Leis, como no Estado de Direito. Aquilo que ele nunca poderá desrespeitar são as Pessoas da sua comunidade, o seu povo.Pelo contrário, no Estado de Direito o governante supremo pode perfeitamente desrespeitar as Pessoas, o povo - aquilo que ele não pode é desrespeitar as Leis.

O governante supremo de um Estado de Pessoas é a voz do seu povo e este é verdadeiramente o Estado democrático. Pelo contrário, o governante supremo do Estado de Direito é a voz daqueles que fazem as leis, e esses são normalmente uma casta que não representa o povo.

Portanto, não existe mal nenhum que Portugal não seja um Estado de Direito. Desde que volte rapidamente a ser um Estado de Pessoas.

Uma última observação, antecipando a questão: Como é que se tira da governação o governante supremo dum Estado de Pessoas que não cumpra as suas obrigações, nomeadamente que, por qualquer razão, deixe de ser o intérprete, o porta-voz e o representante fiel da sua comunidade ou povo.

Fala-se com ele para o chamar à razão. Se ele não se corrigir, o povo tira-o do lugar que ele ocupa. Se não for a bem, vai a mal. É assim também com o governante supremo do Estado de Direito. Se perder as eleições, tem de sair. Se não sai a bem, sai a mal.

14 comentários:

Euro2cent disse...

"Fiat justitia ruat caelum" é uma máxima interessante. Passei agora pela página da Wikipedia, que me ensinou uma ou duas coisas ( http://en.wikipedia.org/wiki/Fiat_justitia_ruat_caelum )

Vivendi disse...

A complexidade da justiça num país católico...

https://www.youtube.com/watch?v=t1nM97hszLY


Por cá quiseram que fosse assim...

https://www.youtube.com/watch?v=J522b1pQo7U

Vivendi disse...

Aula de Introdução ao Estudos Europeus.

País: Itália

Professora: A Itália é um país, Blá, blá... "também conhecido pela máfia, a pior do mundo"...

Aluno: Não, professora! A pior máfia do mundo é a portuguesa!

Professora e turma: riso geral na sala.

Aluno: A pior máfia do mundo é a portuguesa pois toda a gente sabe que ela existe mas ninguém a conhece.

Professora e turma: Silêncio. afirmativo.

Vivendi disse...

O sistema de justiça em Portugal é uma grande porcaria mas obstante isso não iliba que não existam escrapúlas da pior espécie paridos pelo regime abrileiro e que passaram incólumes às vigarices criadas durante os finais dos anos 70, anos 80, anos 90 e na 1ª e 2ª década do séc. XXI.

Os poltrões arrebentaram assim aos poucos com os alicerces que sustentavam esta velha e secular nação.

Uma pergunta? É possível um país cair como caiu praticando o bem?

Mais importante que a pergunta sobre a liberdade do Joaquim, fica esta pergunta...

Quem praticou mais o bem?

- O Salazarismo
- A Actualidade (Abrilismo)

Euro2cent disse...

> Mais importante que a pergunta sobre a liberdade do Joaquim, fica esta pergunta...
>
> Quem praticou mais o bem?


Bem metida.

"Pelos seus frutos os conhecereis" é uma máxima extremamente científica e tristemente esquecida.

Anónimo disse...

Vivendi, admitindo que quem praticou mais o bem foi o tal salazarismo eu perguntaria: e depois?
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O que é que contribui para a nossa felicidade responder afirmativamente a essa pergunta?
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O que está em causa não é se o salazarismo foi melhor ou pior, mas sim perceber como se geram cpom consistencia e constancia os tais salazares.
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Rb

Anónimo disse...

Porque se formos por aí pois eu creio que quem praticou mais o Bem foi o Dom Joao II. Esta discussão não interessa ao menino jesus porque discute-se pessoas (mortas) e não os sistemas que as podem produzir.
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Rb

Anónimo disse...

É tipico da nossa mentalidade esperar que um Dom Sebastião nos caia em cima em vez de procurar meios de o trazer a casa.
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Rb

Anónimo disse...

São os velhos do restelo. Um gajo até os compreende mas ficasse um bocado aborrecido de estar sempre parados a olhar para o nevoeiro.
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-Olha vejo ali umas sombras.
- É dom sebastião.
- Viva, estamos safos
- Não espera, é apenas o cacilheiro
- Bolas
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Rb

Anónimo disse...

-Tambem podia ser a Zazie na sombra a pedir desculpas pelas ofensas?
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-Poder podia, mas não parece crível que pudesse descer a esse nível.
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-Ah é porque talvez não queira dar o braço a torcer por causa do orgulho.
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- Se é por isso temos bom remédio.
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- Qual remédio?
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- Propões-lhe tu perdão pelas ofensas que te enviou a tua maezinha e ao teu rabinho.
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-Está bem, eu proponho.
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- Então propõe.
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- Está proposto. Da minha parte já esqueci.
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- Hummm e aquele nabo do muja?
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- Epá isso tambem já é pedir demais. O gajo ultrapassou o minimo da decência.
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- Deixa lá isso. Ele tambem não se sente bem com isso.
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- Está bem. O muja tambem está incluido.
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- Optimo
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Epá, mas não prometo conter-me quando ele começar a falar de judeus e...
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Rb

Vivendi disse...

"Pelos seus frutos os conhecereis"

Fruta podre:

Soares revela, finalmente, discurso na maçonaria francesa.

http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=4265976

Vivendi disse...

"Pelos seus frutos os conhecereis"

Fruta podre:

Sócrates dá 600 mil euros a Soares em plena crise Governo Sócrates foi o principal financiador da Fundação Mário Soares.

Ler mais em: http://www.cmjornal.xl.pt/exclusivos/detalhe/socrates-da-600-mil-euros-a-soares-em-plena-crise.html

José Lopes da Silva disse...

"Portanto, não existe mal nenhum que Portugal não seja um Estado de Direito. Desde que volte rapidamente a ser um Estado de Pessoas."
Era isso o que eu sugeria há tempos: um novo regime tem que respeitar o nome e a linguagem do actual para ser aceite.

Pedro Sá disse...

O PA a utilizar a linguagem do Pablo Iglésias AHAHAHAH!