... o médico ... é um personagem muito especial. Pertence à
classe da sociedade que exige mais reflexão e conhecimentos. Não existe outra
profissão que imponha tantos anos de preparação e estudo. Além disso, lidando
toda a vida com a dor e o sofrimento, necessita de grande solidez anímica e
sentido ético. Mas, por outro lado, não há nenhuma outra formação tão estreita,
dirigida e especializada. O médico gasta anos apenas para estudar o
funcionamento de um pequeno mecanismo, o mais complexo e sofisticado do
universo conhecido, mas muito reduzido. Trabalha durante décadas para
compreender o joelho, o ventrículo esquerdo ou uma infecção particular da
córnea. Nunca tanta energia humana foi aplicada em espaço tão minúsculo.
Dada a magnitude da preparação e a exiguidade
do âmbito de aplicação não admira que se gerem enormes distorções pessoais. Os
grandes médicos são génios incomparáveis num campo muito limitado. Isso
significa que os clínicos são, em geral, pessoas cuja enorme educação superior
os privou de conhecimentos na área relacional, política, comunitária e até
pessoal. Por formação, têm menos sensibilidade diplomática, social, relacional
e artística que os juristas, arquitectos, militares, até que os engenheiros,
porteiros ou mineiros. Mas, de tão eruditos, nunca se dão conta disto.
Se o problema é genérico, existe um campo em
que se manifesta particularmente nítido. Em especial, há um elemento
radicalmente oposto à mentalidade médica: a economia. Um espírito clínico nunca
conseguirá dominar a lógica económica. Um médico faz muitas escolhas na vida,
talvez mais do que qualquer outra profissão. Mas em todas as suas opções entra
um elemento absoluto, irredutível e incomparável, a vida. Por isso lhe é tão
difícil compreender as subtilezas da negociação, do compromisso, do equilíbrio.
Esta é uma característica que partilha com os padres. Não se pode pedir a alguém
que passou o dia a decidir sobre a vida dos outros que entenda os pormenores de
um orçamento.
...
João César das Neves
2 comentários:
Isso significa que os clínicos são, em geral, pessoas cuja enorme educação superior os privou de conhecimentos na área relacional, política, comunitária e até pessoal.
Admiro o Dr. César das Neves por muitas razões, mas para este seu peditório eu já dei. Já estou farto de ouvir tangas dessas, de muita gente, a respeito também dos engenheiros.
Mas no que aos médicos diz respeito, seguem-se algumas biografias elucidativas:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Namora
http://pt.wikipedia.org/wiki/Miguel_Torga
http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A3o_Lucas
http://pt.wikipedia.org/wiki/Nicolau_Cop%C3%A9rnico
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Lobo_Antunes
Os médicos são pessoas e como pessoas que são tem vários interesses.
O meu irmão é médico, casado com uma médica (país da rapariga são ambos médicos), a realidade é que tem todos interesses que vão para lá da medicina.
Mas da relação que já tive com alguns médicos, a realidade é que a maioria tem a mania que são mais que os outros.
A maioria tem baixos conhecimentos
de economia, ou melhor tem conhecimentos ao nível de outros tipos de licenciados.
Tive uma vez uma grande discussão sobre O Valor das coisas, todos os médicos que conheci, não percebem que Custo não é igual a valor.
Mas tem imensos interesses, desde desportivos, a musica classica, etc..
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